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Oscar Ribeiro de Godoy

 

DR. CAMILO DE SOUZA PENNA

Buraco da Goteira do telhado em frente ao Rancho Santo Antônio

Foi grande amigo de Campos do Jordão e aqui freqüentava todos os anos, nas suas férias ou finais de semana. Era descendente dos Penna de Minas Gerais e foi casado com uma irmã de minha mãe, a Sra. Zenóbia de Oliveira Penna. Diplomara-se em farmácia e chegou a montar uma em São Paulo. Não gostando de exercer essa profissão, mesmo casado e já com a única filha que teve, Elayla, passou a estudar medicina na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, na época a mais prestigiada do país.

Diplomado, montou um consultório na casa em que residia, na Avenida Pompéia, e ali trabalhou por muitos anos. Especializou-se em tuberculose e freqüentou o Instituto Clemente Ferreira, na Rua da Consolação, onde atendia diariamente inúmeros enfermos atingidos pelo bacilo de Koch. O trato freqüente com enfermos o levou a contrair a doença que, por longos anos, o martirizou e o levou à morte.

Ele foi também grande freqüentador do Rancho Santo Antônio. Ao adoecer ficou no Rancho por vários meses. Recordo-me que, numa dessas temporadas, chovia muito e ele passava o dia na janela observando aquela interminável chuva de verão de Campos que durou 20 dias sem parar um só minuto. A exasperação pela prisão em casa levou meu tio Camilo a se distrair, brincando com uma varinha no buraco que uma goteira do telhado fazia no chão do quintal, na frente da casa. Com essa diversão, lembro-me que o buraco ia aumentando de tamanho e ele teve que trocar a varinha por uma maior. O buraco chegou a medir cerca de 5 metros de profundidade e tinha o diâmetro de uma vara de bambu. Este fato despertou-lhe o desejo de levar a brincadeira adiante: ele pretendia enfiar pelo buraco abaixo um vidro com um bilhete contando da existência de ouro em barras em determinado local por ele inventado na hora. Pedi que não fizesse a brincadeira, pois era de se imaginar o tormento que teria alguém fazendo alguma terraplanagem daqui há uns cem anos e encontrando a garrafa com o “mapa da mina”. Seu caráter íntegro e bondade o levaram a desistir da maldosa brincadeira.

Era bom mineiro e, como tal, econômico e inimigo de gastos por pequenos que fossem. Eu ainda era moleque quando ele e a esposa moravam num sobrado na Rua São João, hoje Comandante Salgado. Certa ocasião, achou um anel de alto valor e, no dia seguinte, saiu um anúncio no jornal prometendo boa gratificação para quem o tivesse achado. Ele me pediu para fazer a entrega e dizer que eu o achara. A jóia era de uma senhora recém-casada que estava desolada com a perda. Só faltou me abraçar e beijar tal o contentamento evidenciado com a minha chegada. Passei por um menino muito honesto, e louvaram em demasia a minha atitude, retribuindo-a com polpuda gratificação. Entreguei tudo ao meu tio que, repartindo o prêmio, me encheu as mãos de moedas.

Numa das últimas estadias no nosso Rancho, o que era para nós um imenso prazer pelo elevado grau de companheirismo e amizade, fora chamado a São Paulo por motivo de doença em pessoa da família. Como sempre acontece no início do ano, chovia a cântaros e, durante a noite, caiu um pinheiro na estrada onde hoje se situa a portaria do C I P. Chegamos ali, conduzindo-os para tomar o bondinho para Pinda. Eles ficaram profundamente aborrecidos com o inesperado obstáculo e minha tia começou a se lamentar por não poder alcançar o trem e, como conseqüência, não poder atender o chamado de São Paulo.

Não dispensava de ter no meu carro uma pá e uma pequena enxada, pois freqüentemente precisava usá-las, sendo as estradas de terra e sem nenhuma conservação. O pinheiro havia caído na beira da estrada e, como sempre acontece, formou-se, no rompimento das raízes, um grande buraco e, ao examiná-lo, percebi que poderia passar por ele com pequena escavação na entrada e na saída. Deixei-os no carro, pois continuava o aguaceiro e meti mãos à obra. Fiz uma ladeira para descer no buraco e outra para subir de novo na estrada. Tudo isso na conta exata para as rodas do Fordeco. O chão ainda estava encharcado e, com a torcida dos tios, rompi do outro lado, após trancos e pulos dos passageiros. Alcançamos o bondinho e correu tudo bem.

Algum tempo depois, ele voltou para Campos, mas a doença já o dominava de forma irreversível. Acompanhei, como sobrinho e colega, em seus últimos momentos, levando-o para São Paulo, onde queria morrer. Quando me lembro do seu sofrimento, fico imaginando como pôde um homem bom, correto, excelente chefe de família, exemplar colega e amigo, padecer tanto nos últimos momentos da vida, como pude assistir impotente e pesaroso. O que me diminui a dor é saber que ele se foi cercado pelo carinho da dedicada esposa, de familiares e de vários colegas.

 

 

 

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