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Fotografias que contam a história de Campos do Jordão.

 

 Palácio Boa Vista - Campos do Jordão


 

1 - O Palácio Boa Vista

1.1.

O Interventor do Estado era Adhemar de Barros e o Prefeito Sanitário, José Arthur da Motta Bicudo. Desde os idos de 1938 até a sua morte, Adhemar sempre freqüentou Campos do Jordão. No tempo da Interventoria, já despachava na residência de seu irmão, em Vila Capivari.
Foi então que surgiu a idéia de construir-se uma casa para acolher o Chefe do Poder Executivo, quando de seus despachos com o secretariado no alto da Mantiqueira.
Um belo dia, o então prefeito Motta Bicudo, aproveitando da presença do Interventor em Campos do Jordão, convidou-o a dar um passeio até o Alto da Boa Vista, lugar ermo e desabitado, não obstante de uma beleza panorâmica e deslumbrante.
Dizem que a reação de Adhemar foi a seguinte:
- Estou com muita dor de cabeça, mas vamos lá...
De fato, utilizando-se de uma estradinha de tropeiros, começaram a subir a montanha, o Interventor, o Prefeito, o engenheiro da Prefeitura, Aristides de Souza Mello e o escrivão Délio Rangel Pestana. Chegando lá no alto, exaustos, contemplando a visão espetacular de vales e morros que se perdiam no horizonte, Adhemar ficou impressionado e dizia que a dor de cabeça desaparecera...
Nesse momento, a construção de uma simples casa, logo evoluiu para a edificação da sede de veraneio do Governo do Estado, ali, bem no platô daquelas montanhas.
A versão do Prefeito Motta Bicudo é outra: a idéia não nasceu por acaso.296
Conta que, estando o prefeito em Congresso Climatológico no Rio de Janeiro, ouviu do Interventor de Minas Gerais, Benedito Valadares, que gestões estavam sendo feitas para anexar Campos do Jordão ao Estado mineiro, à vista das extraordinárias potencialidades turísticas da cidade montanhesa.
Motta Bicudo, mais do que depressa, correu para São Paulo e contou o ocorrido ao Interventor Adhemar, que decidiu tornar as coisas irreversíveis e dificultar o plano mineiro.
Uma das providências preliminares era instalar logo um Palácio de Verão do Governo paulista em Campos do Jordão.
Versão à parte, a verdade é que o Interventor Adhemar de Barros, cercado por sua comitiva, lá no Alto da Boa Vista, determinou a Motta Bicudo que intercedesse junto à Cia. Brasileira de Colonização, proprietária daquelas terras, no sentido de obter a doação de 50 alqueires.
Intermediou as negociações Eduardo Moreira da Cruz, que era o representante da empresa na cidade. De fato, a Cia. Brasileira de Colonização e o Dr. Carlos Eckman acabaram doando 8,40 alqueires (203.280m2), representada a empresa por seu presidente, Olavo Jaguaribe Eckman, conforme escritura, de 12 de julho de 1940, à qual o Estado compareceu, autorizado pelo decreto 11.152, de 7/6/40.
Antes mesmo da doação formalizada pelo Decreto nº 11.027, de 11 de abril de 1940, fora desapropriada uma outra área de 6,29 alqueires, pertencente a Bento Sampaio Vidal, e outra de 8,44 alqueires, de Antonio Lacerda de Abreu, através do decreto nº 11.047, de 19/4/1940.
Pelo Decreto nº 19.613, de 8 de agosto de 1950, foi desapropriada área de 12,51 alqueires, pertencente a diversos proprietários, e finalmente em 13 de janeiro de 1964, foi expropriada a quarta área de 10,46 alqueires, esta última também pertencente à Cia. Brasileira de Colonização, perfazendo-se assim o total de 37,86 alqueires, ou seja 916,212m2.
Logo que o Interventor Adhemar desceu o Alto da Boa Vista, por veredas marcadas de lindas paragens, o prefeito Motta Bicudo e o Eng. Aristides de Souza Mello lembraram logo de um nome, o do arquiteto Jorge Pitzrembel, que possuía uma casa no sítio Uirapuru, no caminho do Umuarama, a quem se solicitou à elaboração de um anteprojeto de um Palácio do Governo, no estilo inglês “Maria Tudor”.
Concluídos os estudos preliminares, Adhemar liberou as primeiras máquinas para os serviços de terraplenagem, e logo os alicerces foram levantados pelo construtor Floriano Rodrigues Pinheiro. Benedito Cândido da Silva, fiel guarda do Palácio, de 1940 a 1966, trabalhou desde as obras primeiras, em 1938, como ajudante de pedreiro.
Os engenheiros responsáveis foram José Luiz de Mello Matos e Clóvis Eretangy.
Depois de levantadas as paredes e coberto o “Castelo”, como era chamado pelo povo, permaneceu o prédio fechado por 26 anos.
Trabalharam na sua edificação, Floriano Rodrigues Pinheiro, José Julião e Francisco Bento.
No seu interior, durante esse longo tempo, amontoavam-se tacos, janelas e portas em estado de abandono.
Tapumes foram pregados nos vãos das portas e janelas.
Conta Benedito Cândido que assistiu de tudo naquele “Castelo” abandonado, desde tentativa de terrorismo, com ameaça de precipitação de bombas até a busca de namorados que acorriam ao Palácio em noites de luar para colóquios amorosos.297
Impediu que turistas levassem tacos como “souvenires” e bem assim a ação de depredadores que pretendiam destruir as coisas. Abandonada, a construção serviu de ninho de morcegos, ratos, pássaros pretos e até de urubus.
Benedito fazia rondas noturnas e percorria os andares superiores, com o que, pisando aqui e acolá, provocava estranhos barulhos em meio aos materiais jogados ao chão.
As pessoas que passavam à noite, nas imediações, ao ouvirem os noturnos estalidos, logo espalhavam notícia de que o Palácio era mal assombrado e que fantasmas percorriam os seus interiores, nas noites escuras.
Por vinte anos, o edifício ficou sem luz, água ou qualquer acesso.
Até mesmo um pé de oliveira chegou a crescer e dar frutos no interior do prédio, tendo sido, mais tarde, transplantado para o pátio do Palácio, onde se encontra até hoje.
Conta Benedito, que, certa feita, chegou a sofrer temperatura de 18 graus negativos, num dos rigorosos invernos do Alto da Boa Vista.
Explicou Floriano Rodrigues Pinheiro que o projeto do Dr. Jorge Pitzrembel foi aproveitado tão somente no que concerne às divisões internas, tendo sido executada a primeira parte do projeto, com previsão de custo de 2.500 contos de réis, no período de 1938/1939.
Depois de levantar as paredes e cobrir o prédio, instalou-se água e aquecimento somente no andar térreo.
Os tacos foram trazidos de Sta. Catarina por 700 contos de réis e uma caldeira foi instalada com a assistência do Eng. Homero Lopes. Os tacos foram implantados com a assistência de Otto Baumgart. Deixando o Dr. Adhemar de Barros a Interventoria, a obra permaneceu paralisada de 1940 a 1952. O Governo Lucas Nogueira Garcez liberou nesse último ano, uma verba de 4.700 contos, tendo Floriano Rodrigues Pinheiro prosseguido nas obras: Fez os rebocos internos, a fachada, completou a calefação e o madeiramento do salão nobre e finalmente o assentamento de azulejos na cozinha e banheiros.
Encarregou-se da parte financeira, o então diretor do Banco do Estado de São Paulo, Dr. Paulo Rocha Camargo.
Era muito difícil o acesso ao Palácio, conta Floriano, motivo por que o transporte de materiais era penoso, e após o término dos serviços contratados, permaneceu longo tempo sem receber o pagamento de seu trabalho, que somente veio a realizar-se quando Jânio Quadros assumiu o Governo.185
Um dos operários chegou a falecer, durante a construção, em dia de trovoada, atingido por um raio.


1.2.

Fechado e inacabado, o Palácio da Boa Vista sofreu, a partir daí, um penoso processo político onde se procurou, por todas as formas, atribuir-lhe destinação incompatível com a de sede de governo.
Não obstante, em julho de 1949, o Governador Adhemar de Barros despachava em Campos do Jordão, em sua residência, com o Secretário da justiça, Dr. César Lacerda Vergueiro, Secretário da Educação, João de Deus Cardoso de Mello Neto, Secretário da Segurança, Gal. José Scarcela Portela, Secretário da Agricultura, Salvador de Toledo Artigas e Secretário da Saúde, Herbert de Vasconcelos.
Era quase todo o Governo do Estado, atuando em Campos do Jordão.
O próprio Governador Adhemar de Barros, em 19 de janeiro de 1950, pelo Decreto nº 19.121, transformou o Palácio em Museu Florestal, transferindo-o para a Secretaria da Agricultura.
De repente, uma nova destinação surgia; o Governador Jânio Quadros sensibilizara-se ante sugestões oriundas da própria cidade, no sentido de transformar o prédio em um hotel, com capacidade para 100 apartamentos, para posterior arrendamento a particulares.
A imprensa paulistana anunciava na época: “Vai se transformar em Hotel o Palácio de Verão do Governador”.298 Passado algum tempo, outras notícias passaram a espalhar-se, e algumas alarmantes, como a de que o Palácio seria transformado em um hospital.
Em 4 de setembro de 1955, o jornal “A Cidade de Campos do Jordão” anunciou que Jacques Perroy empenhava-se em obter o aproveitamento do Palácio como Centro de Encontros Universitários.
No mesmo jornal, em 23 de outubro de 1955, Joaquim Corrêa Cintra rebatia a idéia de vender-se o Palácio a particulares, para, com o produto da venda, construir-se um asilo em São Paulo, conforme sugeria um matutino paulistano.
Em 10 de maio de 1959, reunia-se o Conselho Estadual de Cultura, presidido pelo Dr. Márcio Ribeiro Porto, Secretário do Governo, quando se cogitou instalar no edifício do Palácio uma Universidade de Artes, em regime de internato, para conferências, exposições e festivais.
Em 27 de maio de 1959, Fausto Bueno Arruda Camargo indicava, em moção, ao VII Congresso Estadual dos Municípios, a necessidade de se concluírem as obras do Palácio pelo então Governador Carvalho Pinto, destinando-o como sede dos negócios do Governo, durante o verão, e o seu aproveitamento para fins culturais em outras épocas.
Uma outra sugestão do vereador Jonas Filipini, surgia em 31 de maio de 1960, a de doar o edifício às entidades sindicais de São Paulo para a construção de colônias de férias dos metalúrgicos, tecelões, comerciários e jornalistas.


1.3.

Conta Fausto Camargo que, em 1960, ocorreu-lhe uma idéia luminar, qual seja, a de solicitar a Hans Hillebrecht, proprietário do Grande Hotel, alguns apartamentos, a título gracioso, com o fim de hospedar deputados que seriam convidados para conhecer o Palácio Boa Vista.140
Naquele tempo havia 13 partidos políticos e o ônus financeiro seria grande, caso se convidasse a todos e, por isso, escolheu-se os deputados janistas, que faziam oposição frontal e decidida à destinação do Palácio como sede do Governo.
- Seria um fim de semana, não vai ficar caro! argumentava Fausto a Hillebrecht.
De fato, inúmeros deputados acederam ao convite, inclusive os da oposição, como Araripe Serpa, Germinal Feijó, Gustavo Martini, Onofre Gosuen, Arruda Castanho e Juvenal Campos entre outros, que, “in loco”, conheceram as instalações, convencendo-se que era impossível dar ao edifício outra destinação, que não a de Palácio.
O deputado Araripe Serpa chegou a declarar: “Afinal São Paulo, pela sua grandeza, pela sua pujança, pelo seu poder econômico pode ter também um Palácio de Veraneio para o Governador do Estado nestas alturas da Serra da Mantiqueira.
Senhores, isto não é luxo, porque até nas áreas socialistas existem palácios”.299
Os deputados, com certeza, demoveram o Governador Jânio Quadros, que respeitou a destinação originária. Retornando ao Governo, Adhemar visitou o Palácio em 16 de maio de 1963, acompanhado do Secretário de Obras, Silvio Fernandes Lopes, determinando que se reiniciassem as obras, dando-se curso à instalação de água, telefone e esgotos.
Por via do decreto 41.739, de 21 de março de 1963, o Governador transferiu o Palácio do Governo, da Secretaria da Agricultura para a do Governo, e, em maio de 1964, retomando ao local das obras, acompanhado de Hélio Azevedo e Fausto Bueno de Arruda Camargo, percorreu as dependências da edificação.
Fausto Camargo, que sempre foi da mais estreita intimidade de Adhemar de Barros, disse-lhe: - Governador, por que V. Excia. não dá ordens para a conclusão definitiva do Palácio, já que parte do material adquirido acha-se amontoado e ameaçando estragar-se?
Sugeriu ao Governador que, concluído o Palácio, o prédio poderia ser inaugurado por ocasião do próximo aniversário de Dona Leonor, a 21 de julho de 1964, data deveras marcante, pois fora nesse dia, em 1938, lançada a pedra fundamental do edifício.
Convencendo-se da justeza da explanação, Adhemar de Barros, ali mesmo, determinou que as obras do Palácio deveriam ser concluídas, rapidamente, de onde resultou uma grande ofensiva nas obras: colocação de tacos, portas, janelas, empapelamento, vidros e instalações.
Procedeu-se ao asfaltamento da estrada que dá acesso ao Palácio Boa Vista, em cerca de 3 quilômetros, que o Poder Público Municipal, mais tarde, denominou de Avenida Adhemar de Barros.


1.4.

Na data prefixada, a 21 de julho de 1964, era inaugurado o Palácio da Boa Vista, contando com a presença do Presidente da República, Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, acompanhado de seu Chefe da Casa Militar, General Ernesto Geisel, todos anfitrionados pelo Governador Adhemar de Barros.
As solenidades foram maiúsculas: almoço à americana para 517 pessoas e churrasco para 6.000 pessoas.
A Orquestra Sinfônica de São Paulo abrilhantou o ato.
Logo após a inauguração, Fausto Bueno Arruda Camargo era nomeado administrador do Palácio Boa Vista, com poderes para requisitar mobiliários nas diversas repartições do Estado, recebendo todo apoio do então Secretário do Governo, deputado Juvenal Rodrigues de Moraes. Alguns móveis foram trazidos do Salão Amarelo, do Palácio dos Campos Elíseos, e bem assim, uma cama, que fora especialmente construída para o Gal. Charles de Gaulle, quando recebido pelo Governador Abreu Sodré, como hóspede do Governo de São Paulo.
O Diário Oficial do Estado, de 5 de novembro de 1964, publicou a constituição de uma comissão estadual, encarregada de receber doações e peças para o Palácio, presidida pelo prof. Fued . Inúmeros problemas de verbas orçamentárias, na medida do possível, foram contornadas por Fausto Camargo, que contava com a assessoria do Dr. Gualter Godinho, Chefe do Serviço Jurídico da Casa Civil do Governador.
Cassado o Dr. Adhemar de Barros, ao assumir o Governador Laudo Natel, o mobiliário e Palácio sofreu atentado cometido por vândalos: cortaram a navalha todos os panos e couros dos móveis. O Palácio foi fechado à visitação pública, iniciando Fausto Camargo, em 1966, a arrecadação de doações no comércio jordanense visando a sua separação.
Vários melhoramentos a partir daí foram construídos, como o prédio para a Guarda Militar, onde foram construídas 24 baías para cavalos, a fim de abrigar a Polícia Montada do Palácio, cujo uniforme obedece ao estilo canadense, azul marinho e vermelho.
Para a constituição dessa Guarda Especial colaborou o Cel. Raul Humaitá, então Comandante do Batalhão de Cavalaria da Polícia Militar.
Contou Fausto Camargo que prestaram serviços nas obras de construção do edifício, os engenheiros do Departamento de Obras Públicas do Estado, a partir de 1938: Oscar Machado de Almeida, Francisco Prestes Maia, Alarico Mattos, José Barros Pimentel e Hélio Azevedo.


1.5.

Em fevereiro de 1963, o Eng. Rubens Álvaro Bueno foi encarregado de reflorestar as áreas livres do Palácio, plantando 116,329 pés de pinus elliotis e em 14 de julho de 1965, iniciou o plantio de cerejeiras ornamentais, hortênsias e quaresmeiras, na via de acesso ao Palácio, cujas primeiras mudas foram plantadas pelo Governador Adhemar de Barros e seus familiares.
O Parque das Cerejeiras que circunda o Palácio originou-se de um pedido do então deputado Shiro Kyono, dirigido ao Governo Japonês, solicitando a doação de 500 mudas de cerejeiras ornamentais. O pedido foi renovado por Fausto Camargo, em 30 de janeiro de 1966, quando da visita do Embaixador Keichi Tatsuke a Campos do Jordão, e, em janeiro de 1969, a alfândega do Rio de Janeiro comunicava achegada do pedido.
Essa aclimatação da cerejeira ao clima jordanense resultou na aprovação de lei municipal, de iniciativa de Fausto Camargo, sancionada pelo prefeito Arakaki Masakazu, que criou a “Festa da Cerejeira em Flor”, comemorada, oficialmente, em setembro de cada ano.
Mudas recebidas de Portugal e Argentina foram imediatamente plantadas,e, atualmente, não somente florescem as cerejeiras ornamentais, como também as de fruto, que chegam a vergar os galhos de tanta produção.
Contou Fausto Camargo: “Assisti defronte a um pé de cerejeira em flor uma cena que me comoveu: um velho imigrante japonês ao ver uma cerejeira em flor, ajoelhou-se diante da árvore e colocando as mãos nas faces, começou a chorar de emoção”.299

2 - Museu e Monumento Público

2.1.

O aproveitamento cultural do Palácio Boa Vista sofreu grande incremento no Governo Abreu Sodré, no período de 1967 a 1971.
O Dr. Luiz Arrobas Martins, então Secretário do Estado, que freqüentava, constantemente, a Estância, sensibilizou-se com a necessidade de ser definitivamente instalado o mobiliário do Palácio.
Em 30 de dezembro de 1967, o Governador Roberto Costa de Abreu Sodré nomeava comissão incumbida de propor sugestões, visando à instalação de um Museu de Mobiliário Histórico e Artístico Brasileiro, particularmente colonial, no Palácio Boa Vista, que, “entretanto, não perderia as suas funções de veraneio”.
Foi seu primeiro presidente, o Dr. Pedro Antonio de Oliveira Netto.
Até 1969, o Palácio não oferecia grandes atrativos - escreveu Sheila Leirner.
Foi quando surgiu, em maio do mesmo ano, o Geapac - Grupo Executivo de Aproveitamento do Palácio de Campos do Jordão, criado pelo governo do Estado, através do decreto 51.966, com a finalidade de estudar e fixar as linhas e os limites em que o mesmo pudesse ser melhor aproveitado. Com isso, concretizava-se a idéia de enriquecer o patrimônio cultural do Estado, quase todo agrupado na Capital, e criar um centro de real interesse em uma cidade turística, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos e na Europa, como em Lyon, Dijon e outras cidades.
O principal responsável pela idealização e execução desse projeto foi Luiz Arrobas Martins, então Chefe da Casa Civil do Governo, que escolheu, juntamente com sua esposa, Dona Alícita, os trabalhos que completaram a coleção, em cuja parte pictórica, os artistas se encontram representados, em seus melhores momentos.
Ao justificar a escolha de Campos do Jordão para o investimento cultural, Arrobas Martins, disse: “Campos do Jordão é uma cidade turística; precisa de atração. Agora, todos tem parada obrigatória no Palácio, que faz parte fundamental no roteiro turístico da Estância.
O nosso maior objetivo é a descentralização do patrimônio cultural. Basta ver o exemplo de Paris, que reúne oitenta por cento de seus valores artísticos, enquanto o resto está distribuído entre os museus da província”.
A coleção do Palácio Boa Vista possui significativa representatividade das artes plásticas brasileiras da época pré-modernista e da fase compreendida entre 1913 (ano da primeira exposição de Lasar Segall) e 1950, quando a Pinacoteca do Estado começou a adquirir obras de artistas modernos, o que significou a admissão oficial da arte contemporânea em nosso País.
Segundo Sheila Leirner, foram estes os principais limites cronológicos e históricos que orientaram o Dr. Arrobas Martins durante um ano, de intenso trabalho de compra e organização, sempre aconselhado pelos críticos que elegeu para o auxiliar na apreciação e avaliação das obras.
Foram eles Paulo Mendes de Almeida, Almeida Salles e Oswaldo de Andrade Filho.
Porém, foi, principalmente, atento às qualidades plásticas e à importância didática dos trabalhos que adquiria, com conhecimento e sensibilidade artísticas, que lhe foram peculiares, que o então Chefe da Casa Civil do Governo de São Paulo, conseguiu montar uma das coleções mais importantes do País. Em uma de suas andanças, na constituição do acervo cultural, o Dr. Arrobas Martins apaixonou-se por um pequeno quadro, que retratava Obidos, em Portugal, de onde Bonadei, acabava de chegar. A resposta foi dura:
- Este é do meu acervo, não vendo nem para o senhor e nem para o Estado! É... todo artista tem essas coisas, dizia o saudoso Arrobas Martins.
Não desistiu, e, em uma das inúmeras visitas que fez a Bonadei, levou sua filha de cinco anos, tentando mais uma vez persuadir o artista.
Bonadei encantou-se com a menina, ele adorava criança, dizia Arrobas Martins, e quando estávamos saindo, simplesmente, tirou o quadro da parede e o ofereceu a ela...


2.2.

O Governador Paulo Egídio Martins manifestava sua predileção pelo quadro de Tarsila Amaral, “Os Operários” - um óleo famoso datado de 1933, da fase da pintura social da artista, em que são facilmente reconhecidas, entre figuras dos operários que compõem uma fábrica, os retratos de Cassiano Ricardo, Plínio Salgado, Raul Bopp, Oswaldo Costa, Gregório Warchavchik, Flávio Torres e muitos outros.
O Palácio conta com uma sala, o Gabinete do Governador, forrado com dez telas da artista, entre os quais alguns estudos acadêmicos de nus femininos realizados em Paris; seu conhecido auto-retrato, um painel comemorativo e “Calmaria”, um quadro curioso em que Tarsila descreve uma paisagem surrealista, por meio de elementos geométricos.
O Dr. Arrobas Martins, que tinha especial preferência pelos acadêmicos, representados por João Batista da Costa, Alfredo Volpi, A. Salinas, Helena Pereira da Silva e C. Jacquet, cujos trabalhos se reúnem na Sala Dourado do Palácio, admirava muito dois quadros de Eliseu D'Ângelo Visconti, destacando “A Despedida” e “Tênis”, de Vicente do Rego Monteiro e “Mulher Deitada”, uma das obras-primas de Antonio Gomide, participante ativo da Semana de Arte Moderna de 1922.
Na parte externa do Palácio, perfilam-se amostras de azulejos artísticos de Volpi, Zanini e Hilde realizados no atelier de Paulo Rossi Osir, figura das mais atuantes na década de trinta, no movimento “Família Artística Paulista” e que também está representado por trabalho no interior do Palácio Boa Vista.
Desfilam, ainda, pelas galerias e aposentos do Museu do Palácio, trabalhos admiráveis de Anita Malfatti, como “Busto de Moça” e “Retrato de Lalive”, de tendência expressionista; dois excelentes óleos de Ismael Nery – “As Almas”, duas pinturas e uma escultura de Ernesto de Fiore, as paisagens inconfundíveis e maravilhosas de Guinard e de Pancetti, este com “Primavera em Campos do Jordão”, e amostras das diferentes fases da pintura lírica de Volpi.
Anota, finalmente, Sheila Leirner, que do Museu do Palácio Boa Vista, figuram, ainda, trabalhos de Di Cavalcanti (“Mulher e Paisagem, Vaso com Flores e Natureza Morta”); Franz Krajcberg está presente com uma pintura antiga e figurativa, Cícero Dias com seus oníricos devaneios, Nôemia Mourão, Vittório Gobbis, Carlos Prado e Rebolo, um dos principais participantes do Grupo Santa Helena, e, mais tarde, da “Família Artística Paulista”, com a simplicidade e pureza que marcam sua pintura; Tomás Santa Rosa e Bonadei, com excelentes trabalhos.
Compõem também o acervo, trabalhos de Clóvis Graciano, Mário Zanini, Djanira com “Santa Cecília” e “Estação de Belo Horizonte”; Sérgio Milliet, que, além de escritor, poeta, contista, ensaísta e crítico, pintou uma bonita “Paisagem de Campos do Jordão”; Flávio de Carvalho com um óleo, que revela seu veio de desenhista entre as feéricas massas cromáticas que utilizava; Sanson Flexor com composições abstratas e semi-figurativas; Wega Nery, Bruno Giorgi, Marcelo Grassmann, José Antonio da Silva, o mestre da gravura, Oswaldo Goeldi, Soliar, Maria Leontina, Odriozola, Oswaldo de Andrade Filho, Arnaldo Pedroso e outros.
Digno de destaque constituiu o trabalho de Sílvia Sodré Assunção, que na disposição do riquíssimo acervo, aliou harmoniosamente a rica ambientação de cada sala aos quadros, propiciando ao expectador uma apreciação organizada e linear do valioso patrimônio artístico do Museu do Palácio Boa Vista.
Figuram no Museu do Palácio, trabalhos importantes dos consagrados artistas, como Camargo Freire, pintor jordanense e premiado, Sylvio Jaguaribe Eckman, J. Batista da Costa, Dillon, Antonio Lucio, Emilio Luiz, Loty Oswald, G. Hinna, J. Amadio, Bustamante Sá, Fúlvio Penachi, Brecheret e Agnaldo Santos.


2.3.

A partir da constituição do Museu do Palácio, o importante próprio do Estado passou a ter características bivalentes, residência oficial do Governador de São Paulo e centro de cultura do povo brasileiro, facultado à visitação pública.
Em 12 de abril de 1970, o Governador Abreu Sodré, em cerimônia pública, acolitado pelo Dr. Luiz Arrobas Martins, declarava o Palácio Boa Vista, Monumento Público do Estado de São Paulo, reabrindo-o ao povo, depois de dois anos de organização e montagem do Museu. Em solenidade realizada em 1970, na Câmara Municipal, disse o Dr. Arrobas Martins aos vereadores: “Os senhores serão, doravante, guardiões do Palácio Boa Vista, encargo que lhes entrego neste momento”. Milhões de pessoas já o visitaram, provenientes de todas as partes do Brasil e do Exterior.
O Governador Abreu Sodré, em 24 de abril de 1969, autorizava a construção de camping dentro da área do Palácio, em meio aos pinheirais, e, logo, em dezembro de 1970, o Palácio acolhia a Comissão Revisora do Código Civil Brasileiro, sob a presidência do prof. Miguel Reale.
Dela faziam parte, o prof. José Carlos Moreira Alves, o Dr. Nelson Speers, prof. Torquato Castro, prof. Clóvis de Couto e Silva, prof. Ebert Chamoun, prof. Silvio Marcondes, prof. Agostinho Arruda Alvim e Dr. Jader Burlamanque.
O Governador Paulo Egydio Martins, em seu Governo, procedeu a amplas reformas e inúmeros melhoramentos.
Inobstante não se hospedasse no Palácio, preferindo sua bela residência em Campos do Jordão, prestigiou demasiado a sede do Governo, sempre que pode, com sua presença. Os Governadores Paulo Maluf, José Maria Marin e Franco Montoro, em todas as temporadas de inverno, hospedaram-se no Palácio, desembarcando no seu héliporto, o mais alto do Brasil.


Inúmeras personalidades deixaram gravadas nas “Impressões de Visitantes Ilustres”, a sua mensagem:

Juscelino Kubitschek – “A casa que acabo de visitar está bem à altura dos encantos de Campos do Jordão. A simplicidade elegante que funciona em todas as suas linhas é o marco da civilização e do bom gosto de São Paulo” (11/6/72).
Miguel Reale – “Estupenda realização do Governo do Estado, destinada a favorecer encontros culturais, artísticos e científicos, como este que teve lugar, de 14 a 19 do corrente, com os trabalhos da Comissão Revisora do Código Civil Brasileiro. Era o lugar mais propício à obtenção dos resultados alcançados” (18/2/70).
Roberto de Abreu Sodré e Luiz Arrobas Martins – “Este edifício foi declarado Monumento Público do Estado de São Paulo e reaberto à visitação depois de reformado e guarnecido com móveis históricos e objetos de arte, a fim de que se servisse à cultura do nosso povo e ao turismo desta cidade” (12/4/70).
Magdalena Tagliaferro – “Como não dizer-lhes nossa efusiva gratidão por terem enriquecido a nossa terra com tão inestimável contribuição à cultura? O que me comove é ter certeza de que esta obra será duradoura, e que como a mim mesma, constituirá motivo de orgulho e admiração para todos” (24/7/70).
D.Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta – “Tivemos o prazer de visitar este magnífico Palácio, construído pelo Brasil Moderno e ornamentado pelo Brasil Antigo” (15/1/73).
André Franco Montoro – “Este Palácio é um atestado de cultura e do desenvolvimento de S. Paulo. Pode e deve tornar-se um dos centros de aproximação com outros Estados e Nações, na obra de entendimento e progresso cultural” (18/7/73).
Atsushi Uyama - (Embaixador do Japão no Brasil) – “Ao visitar o Palácio do Governo do querido Estado de São Paulo, em Campos do Jordão, faço votos pela prosperidade desse Estado e felicidade do seu povo” (21/9/75).
João Paulo dos Reis Veloso – “Vimos lembrar outro tipo de beleza: o acervo cultural deste Palácio, as obras de arte, e, em particular, o mundo das coisas bonitas da moderna pintura brasileira” (3/1/74).
Lucas Nogueira Garcez – “O Palácio Boa Vista de Campos do Jordão não é apenas uma residência de verão do Governador de São Paulo. Ele é um importante centro cultural que abriga obras de arte representativas de várias escolas, com predominância do período colonial brasileiro” (28/10/73).
Guiomar Novaes – “Neste Palácio encantado de sonhos de cultura realizados, onde o bom gosto, a beleza, a arte imperam, fica ao visitante uma recordação, ainda mais vivida e profunda; a da acolhida de uma hospitalidade perfeita” (24/7/73).
Eleazar de Carvalho – “O Palácio Boa Vista, um dos belos monumentos públicos do Brasil, pode ser comparado pela sua harmoniosa e artística força arquitetônica à 9ª Sinfonia de Beethoven, considerada o Novo Testamento da Religião do Mundo, com a qual encerramos o Festival de Inverno de Campos do Jordão” (30/7/77).
Hélio Borgos Cadal - (Embaixador do Brasil na Grécia) – “Se tivesse duas vidas, dispenderia uma em Campos do Jordão... O Governo do Estado de São Paulo não poderia ter melhor inspiração do que erigir este Palácio, monumento de proporção e bom gosto, a atestar o desenvolvimento cultural da comunidade líder da Federação e exemplo para todo o Brasil” (2/9/73).
Com certeza foi o espírito largo e lúcido de L.B.M. Arrobas Martins, quem ditou essas palavras: “Agora, no interior do Palácio Boa Vista, o que se vê, é o primado do espírito, transformado em obras de arte. Cada peça é um monumento à sensibilidade criativa do homem.
Cada detalhe é a tradução alta do pensamento e da alma que se transfiguram em quadros, esculturas e lances de mobiliário e ângulos originais, e, em tudo, o que enriquece num museu concebido para ser belo, sem o abismo do luxo que acaba por macular a desejada pureza das intenções.
Pelas próprias dimensões artísticas do acervo nele contido, o Palácio Boa Vista é obra que transcende os limites dos Governos, para projetar-se na perspectiva do tempo e, assim, ganhar contornos de perenidade.
Há na finalidade buscada, e já encontrada, a participação generosa do povo, que bem compreende o quanto lhe é útil àquela exposição permanente e do quanto se beneficia ao desfilar diante de tantas obras-primas, algumas com a marca indiscutível do gênio".


NOTAS:

140. Não foram relacionados os suplentes que assumiram os seus cargos desde 1948 até a legislatura 1983/1988.
185. Depoimento de Floriano Rodrigues Pinheiro ao autor.
296. Depoimento de seu filho, Sérgio Ribeiro Motta Bicudo ao autor.
297. Depoimento de Benedito Cândido da Silva ao autor.
298. “Correio Paulistano”, de 29/6/1955.
299. Fausto Bueno de Arruda Camargo em "Campos do Jordão e seu Palácio", S. Paulo, 1983.


OBS: Do Livro “História de Campos do Jordão”, da autoria de Pedro Paulo Filho, páginas 636 a 647 - Editora Santuário - 1986.

 

 

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Fotos Palácio

 


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Obrigado,

 

Edmundo Ferreira da Rocha

 

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