Há muitos anos atrás, o Padre José Vita encontrou-se em Campos do Jordão com o Padre Antonio de Almeida Moraes Jr., mais tarde Arcebispo de Niterói, que viera a Campos do Jordão, pregar em uma solenidade.
À noite, Pe. Vita lhe diz:
- Sabe que tenho um problema a resolver?
Esta semana fui chamado a atender uma menina tuberculosa. Durante toda a semana, procurei um lugar para ela em um dos sanatórios locais. Não havia lugar. Disse então comigo: preciso construir um sanatório para as crianças pobres e abandonadas.
O Pe. Morais Jr. respondeu-lhe:
- Faça, Pe. Vita, eu virei falar no lançamento da pedra fundamental.
Logo, Pe. Vita recebia a doação de uma área de terras de Adelaide S. Hehl, ao mesmo tempo em que adquiria, por compra, um terreno de João Rodrigues da Silva, vulgo “João Maquinista”, perfazendo assim 4 alqueires de matas e alguns pinheiros.
Era outubro de 1932 e terminava a Revolução Constitucionalista.
Campanhas foram iniciadas em vários grupos escolares do Estado objetivando a arrecadação de fundos.
Pe. Vita mandou construir um barracão, a que deu o nome de “Abrigo São Vicente de Paulo”, onde eram, inicialmente, internados doentes adultos, assistidos, graciosamente, pelos Drs. Adalberto Monteiro de Barros e Marco Antonio Nogueira Cardoso.
Mais tarde, Pe.Vita construiu um edifício maior, todo de madeira, destinado a crianças pobres, tuberculosas, uma vez que os doentes adultos tinham à sua disposição a rede hospitalar de Campos do Jordão.
Teve excelente atuação a essa época a Associação das Damas de Caridade, fundada em 27 de junho de 1933, com o fim de socorrer os pobres. A Associação ajudou demasiado a obra do Padre Vita.
Foi no fim de 1935, a conselho do Prefeito Antonio Gavião Gonzaga, que Pe. Vita começou a internação de crianças, inicialmente, em número de 3, de 3 a 12 anos, de ambos os sexos, em ato solene ao qual compareceram o Embaixador José Carlos de Macedo Soares e sua esposa, D. Mathilde.
O Sanatório Infantil começara com 17 leitos e depois passou a 30, para meninos, e igual número para meninas, atingindo a capacidade de 60 leitos.
Os pedidos de internação surgiam de todos os lados.
De início, os serviços internos eram dirigidos por D. Brígida de Freitas, e por um grupo de jovens católicas. Mais tarde assumiram essa supervisão as Pequenas Missionárias de Maria Imaculada.
O nome do Sanatório São Vicente de Paulo começou a propagar-se por todo o País, como sanatório infantil de tratamento de tuberculose, dado o pioneirismo da iniciativa no Brasil e quiçá na América Latina.
Campanhas desencadeavam-se daqui e de acolá para ajudá-lo.
Foi quando Dona Rita Cardoso Penteado começou a congregar senhoras de Campos do Jordão, para confecção de agasalhos às crianças internadas, constituindo uma associação a que se chamou de “Anjos Tutelares”.
Nesse mesmo sentido, eclodiam campanhas em São Paulo, Rio, Santos, e Campinas, e certa feita, tal foi o volume de doações, que foi necessário levar o excedente a leilão.
Começou a germinar em Pe.Vita a idéia de construir um novo sanatório com capacidade para 250 crianças, o que o levou avante, com todas as suas forças. De fato, em 29 de junho de 1940, iniciou a sua construção, lançando a pedra fundamental que teve como madrinha D. Leonor Mendes de Barros, esposa do Dr. Adhemar de Barros, Interventor Federal em São Paulo.
Eis que, quando os alicerces já estavam fincados, o prefeito municipal decide embargar as obras, sob a alegação de que a construção se achava aquém dos limites da zona sanatorial.
Sem perder a calma, Padre Vita vale-se da ajuda de seu amigo, Antonio Gavião Gonzaga, ex-prefeito, que residia no Rio de Janeiro, por intermédio de quem pediu uma audiência ao Sr. Getúlio Vargas, Presidente da República.
Em companhia de Gavião Gonzaga, Padre Vita foi recebido pelo Chefe da Nação, a quem narrou, documentalmente, a situação constrangedora.
Imediatamente, o Presidente solicitou ao seu secretário particular, que, por via telefônica transmitisse o seguinte recado ao Interventor Federal em São Paulo: “Diga ao Dr. Adhemar de Barros, que o Pe. Vita, vindo de Campos do Jordão, está aqui para me apresentar uma queixa, e que o Pe. Vita está por mim autorizado a prosseguir, sem embargo, as obras de construção de seu sanatório, destinado ao tratamento de crianças tuberculosas pobres”.
Evidentemente, a medida antipática não fora adotada por inspiração do Dr. Adhemar de Barros, mas, chegando a Campos do Jordão, de retorno, Pe. Vita reuniu seus operários e lhes determinou o prosseguimento das obras, sem qualquer interrupção até o seu término.
E, de fato, concluiu-se um majestoso edifício com 3 andares, o térreo e mais 2 superiores, em imponentes linhas arquitetônicas, com todos os componentes e instalações hospitalares.
Em 13 de maio de 1946, era fundada a Associação do Sanatório S. Vicente de Paulo, com a assistência do Padre José Vita e a seguinte diretoria: Irmã Maria Letícia Bastos (presidente), Irmã Maria Filomena Rodrigues da Costa (secretária) e Irmã Maria Antonieta Augusta Arantes (tesoureira). A Entidade substituía a Associação das Damas de Caridade, de quem recebeu todo o patrimônio.
Vencido o contrato com as Irmãs de Maria Imaculada, vieram de Pindamonhangaba 10 Irmãs Franciscanas Alemãs, da Terceira Ordem Seráfica de São Francisco com a incumbência de cuidar das crianças, e eis que é marcada a inauguração do novel nosocômio - 28 de agosto de 1946.
São Vicente de Paulo foi à denominação dada à obra, em homenagem ao Santo que percorria, dia e noite, os becos de Paris, recolhendo e amparando crianças recém-nascidas, rejeitadas e abandonadas por seus pais.
Pela manhã, houve a bênção e missa pontificar, oficiada por D. Francisco Borja do Amaral, Bispo Diocesano durante a qual proferiu oração lapidar o grande tribuno sacro, D. Antonio de Almeida Moraes Jr., então pároco da Igreja Matriz de Santo Antonio, de Guaratinguetá.
As 60 crianças que ocupavam o pavilhão de madeira foram transferidas para o novo Sanatório com capacidade para 250 leitos, e durante vários anos, o ilustre médico pediatra, Dr. José Carlos da Silveira, assessorado pela Dra. Maria das Dores Alves Gonçalves, ali prestou serviços.
Atuou em seguida, como diretor-clínico, o Dr. Nathanael Silva, um dos maiores pediatras de São Paulo, e atualmente o Dr. Franklin Alckmin Bueno Maia.
Dez anos depois, Pe. Vita equipava o Sanatório com sala de cirurgia e todo o arsenal especializado.
A Casa da Criança
A poucos metros de sua obra, Pe. Vita edificou sua residência para poder melhor supervisionar o funcionamento do nosocômio, e à direita de quem entra no pátio, havia uma área pantanosa, onde pretendia, um dia, construir um belo edifício para nele funcionar a Casa da Criança.
Depois de drenar o terreno e estaqueá-lo, convenientemente, iniciou essa construção, equipada de dependências com ambulatório, farmácia, capela, dormitórios, berçários, isolamento, cozinha e refeitório, com capacidade para 46 lugares.
No dia 6 de março de 1954, D. Antonio de Moraes, então arcebispo de Olinda e Recife, ali esteve para proceder à bênção e a inauguração da Casa da Criança, que contou com a presença do Governador do Estado, Lucas Nogueira Garcez.
O pediatra Nathanael Silva prestou serviços naquela Instituição como diretor-clínico, sendo sucedido pelo Dr. Franklin Alckmin Bueno Maia.
Foi nessa época rescindido o contrato com as Irmãs Franciscanas Alemãs, e para substituí-las, foram convocadas as Irmãs Franciscanas do Imaculado Coração de Maria, que tiveram o encargo de assistir as crianças enfermas de Pe. Vita.
Instituto Secular
Em outubro de 1957, quando D. Francisco, Bispo da Diocese, visitou a Paróquia de Santa Terezinha, e logo em seguida, o Sanatório São Vicente de Paulo, Pe. Vita reuniu um grupo de voluntárias que foram apresentadas ao Bispo, ocasião em que manifestou o desejo de organizar um Instituto Secular.
Ao se despedir, D. Francisco deixou registrado no Livro de Tombo do Sanatório, a sua solidariedade, dando ao grupo o título de Pio Sodalício.
Elaboradas as constituições para o pretendido Instituto, e levadas a Roma por D. Francisco, por ocasião do Concílio Vaticano II, as mesmas não puderam ser aprovadas por se destinarem à constituição de uma congregação religiosa, e dessa forma, em 1963, D. Francisco deu ao Pio Sodalício, por direito diocesano, o decreto de Pia União, e já em 1966, retornando em visita a Campos do Jordão, recebia a consagração das 7 primeiras voluntárias: Odete Freire, Neuza Vaz da Silva, Elza Lopes, Elza Maria de Abreu, Iracema de Souza, Ramira Teodora dos Santos e Apolônia do Nascimento.
O antigo pavilhão de madeira ficou reservado para a sede provisória do noviciado das futuras filhas de Nossa Senhora das Graças.
Mais tarde, em 13 de novembro de 1973, um ano após a morte de Pe. Vita, a sede do noviciado foi definitivamente transferida para Pindamonhangaba, para a Chácara São José, de propriedade do Sanatório São Vicente de Paulo.
Estavam assim lançadas as bases de um Instituto Religioso, e das 7 primeiras religiosas, a Irmã Odete Freire foi escolhida diretora do Sanatório e Supervisora Geral do Instituto Religioso.
Em 27 de novembro de 1973, atendendo a seu desejo, todo o acervo patrimonial, que se achava em nome da Associação Sanatório São Vicente de Paulo, passou para o Instituto das Filhas de N. S. das Graças, uma vez que, em 2 de fevereiro de 1974 a Sagrada Congregação dos Religiosos e dos Institutos Religiosos do Vaticano dava o “nihil obstat”, para a fundação da Congregação das Filhas de N. S. das Graças.
Padre José Vita
O Pe. José Vita nasceu em 23 de março de 1895, em Sapucaí Mirim, antes conhecida como Santana do Paraíso, cidade mineira, e foi batizado em São Bento do Sapucaí, cidade paulista mais próxima.
Viveu sua infância na fazenda de seu pai, Donato Vita, com sua mãe, Maria Leopoldina Ferreira, e em 1909, ingressava no Seminário Menor de Pirapora, de onde se transferiu para o de Taubaté, em 20 de fevereiro de 1911.
A bênção e vestição, de batina teve lugar em 17 de fevereiro de 1915, e D. Epaminondas Nunes de Ávila e Silva conferiu-lhe as quatro Ordens Menores em 19 de setembro de 1917.
Quando esteve para morrer, por doença cardíaca, já desenganado, Dom Epaminondas conferiu-lhe a ordem do Subdiaconato em 16 de março de 1918, e, no dia seguinte, a Ordem do Diaconato.
Não morreu, porque Deus lhe reservara uma missão.
Passava as férias na fazenda de seu pai, e de lá andava a cavalo 9 quilômetros até a paróquia de São Bento do Sapucaí.
Numa dessas andanças encontrou um menino pobre que insistia em ser padre, mas não tinha recursos, ao que Pe. Vita conseguiu do Bispo Diocesano autorização para que ele não pagasse as anuidades.
Esse menino pobre teve aulas para os vestibulares do Seminário em Taubaté, e seu professor foi Plínio Salgado, o grande escritor e político católico, de São Bento do Sapucaí.
O jovem conseguiu ser aprovado e ingressou no Seminário, de onde saiu para ser o maior orador sacro brasileiro: D. Antonio de Almeida Moraes Jr.
Quem vai, pela variante do bairro Zé da Rosa, em direção a Sapucaí Mirim, em estrada de terra, depois de atravessar uma ponte de concreto, na divisa de Estado, encontrava à direita, uma tosca moradia, com os dizeres: “Aqui nasceu D. Antonio de Moraes, Arcebispo de Niterói.”
Pe. Vita foi ordenado em 20 de abril de 1919, em solenidade presidida pelo Núncio Apostólico no Brasil, D. Ângelo Giacinto Scapardini, uma vez que Dom Epaminondas se achava enfermo.
Sua primeira designação foi para lecionar no antigo Colégio São Miguel, em Jacareí, em 1920, e no início de 1922, foi nomeado vigário cooperador de Caçapava, dali se transferindo para Lambari, em Minas Gerais.
Em maio de 1924 sofre uma hemoptise e retorna à fazenda de seu pai, onde é recebido por sua madrasta, Angelina; recuperando-se, dirige-se a Pindamonhangaba, em casa de sua irmã, Tereza Granato, passando a prestar serviços ao pároco João José de Azevedo.
Dom Epaminondas designa-o para prestar serviços em Santo Antonio do Pinhal, onde, com a ajuda do povo, construiu a Igreja Matriz.
Nessa época, as obras da E. F. Campos do Jordão já chegavam até a estação de Eugênio Lefèvre, a poucos quilômetros de Sto. Antonio do Pinhal.
Em 1926, guiado pela Providência, comprou uma casa em Vila Abernéssia, onde passou a morar com suas duas irmãs solteiras, Mariquinha e Cotinha. Aí iniciou a sua grande obra.
No dia 7 de setembro de 1954, foi agraciado por decreto doPapa Pio XII, com o honroso título de Monsenhor Camareiro Secreto de S. Santidade, presente o Governador Lucas Garcez, e em 30 de abril de 1959, com o título de Cidadão Honorário de Campos do Jordão.
Faleceu em Campos do Jordão, no dia 13 de dezembro de 1972, às 23:45 horas, assistido por suas Irmãs, chefiadas por Odete Freire e pelos seus médicos e amigos, Drs. Franklin A. Bueno Maia e Alfonso Chung Zumaeta.
Em sua homenagem póstuma, a via de acesso ao Sanatório São Vicente de Paulo, passou a ser denominada de “Rua Monsenhor José Vita”, e bem assim a Escola de 1° Grau de Vila Abernéssia.
Apagara-se uma luz na terra, e começou a brilhar mais uma estrela no céu.
OBS: Histórico do Livro “História de Campos do Jordão” da autoria do Escritor Pedro Paulo Filho, Editoria Santuário - 1986, Páginas 295 a 300.
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