Sessão Solene da Academia de Letras de Campos do Jordão - 28.01.2012


Sessão Solene da Academia de Letras  de Campos do Jordão - 28.01.2012

Durante os trabalhos da reunião: o Acadêmico Edmundo Ferreira da Rocha, apresenta amplo trabalho que descreve a vida do Patrono da Cadeira nº 29, da Academia de Letras de Campos do Jordão, o inesquecível Guimarães Rosa, cujo resumo segue abaixo:

Um pouco sobre - João Guimarães Rosa

João Guimarães Rosa, brasileiro, romancista e contista, um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos – sua Magnum opus “Grande Sertão Veredas”, a escola/tradição - modernismo – nasceu em 27 de junho de 1908, no município de Cordisburgo ¬– MG, situada entre Curvelo e Sete Lagoas, distante 120 quilômetros de Belo Horizonte, zona de engorda de gado. Faleceu no Rio de Janeiro em 19 de novembro de 1967, com 59 anos de idade. Também foi médico e diplomata. Foi o primeiro dos seis filhos de D. Francisca (Chiquitinha) Guimarães Rosa e de Florduardo Pinto Rosa, mais conhecido por "seu Fulô", comerciante, juiz de paz, caçador de onças e contador de histórias.

O nome da cidade natal, Cordisburgo, “burgo do coração”, mais corretamente é uma homenagem ao “Sagrado Coração de Jesus”. A etimologia vem do hibridismo cordis, do latim, que significa "do coração"; e burgo, sufixo anglo-saxônico, que significa "vila" ou "cidade". Enfim, a Cidade ou a Vila do Coração.

Era um poliglota, conforme um dia disse a uma prima, estudante, que fora entrevistá-lo:

“Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração.”

No ano de 1925, precocemente, com apenas 16 anos de idade, matriculou-se na então Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais. Nessa época, no ano de 1926, um estudante dessa Faculdade morreu vitimado pela febre amarela. Durante o velório desse estudante, conforme relato do colega de turma, Dr. Ismael Faria, Guimarães Rosa teria dito a famosa frase: “As pessoas não morrem, ficam encantadas”. Essa mesma frase foi usada por Guimarães Rosa, 41 anos depois, quando da sua posse na Academia Brasileira de Letras.

No dia 27 de junho de 1930, ainda estudante, conheceu Lígia Cabral Penna, e ele, com 22 anos de idade, e ela, com apenas 16 anos, casaram-se, no dia do seu aniversário, 27 de junho de 1930. Desse primeiro casamento, desfeito poucos anos depois, tiveram duas filhas: Vilma e Agnes.

No ano de 1930 formou-se em medicina na Universidade de Minas Gerais - UMG e, escolhido por aclamação pelos 35 colegas, foi o orador da turma.

Exerceu a medicina numa cidadezinha pobre que, conforme relatado por sua filha Vilma, não tinha nem energia elétrica. Assim, dois motivos muito fortes afastaram o sensível Guimarães Rosa da medicina: um deles, um fato que muito o abalou: ter presenciado o parto de sua esposa, sem contar com a presença do farmacêutico e médico da cidade vizinha da Itaúna, que somente chegaram depois que a filha Vilma já havia nascido. Outro, sua incapacidade para pôr fim às dores e aos males do mundo.

Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, Revolução de 1932 ou Guerra Paulista, movimento armado ocorrido no Brasil entre os meses de julho e outubro, em que o Estado de São Paulo visava à derrubada do Governo Provisório de Getúlio Vargas e à promulgação de uma nova constituição para o Brasil, Guimarães Rosa prestou serviços como voluntário da Força Pública.

Dotado de cultura invejável e grande erudição, notável conhecimento de línguas estrangeiras, foi entusiasmado para prestar concurso para o Itamarati. Após alguns preparativos seguiu para o Rio de Janeiro e prestou Concurso para o Ministério do Exterior, tendo se classificado em segundo lugar.

Em 1938 foi nomeado Cônsul Adjunto em Hamburgo, Alemanha; seguiu para a Europa onde conheceu Aracy Moebius de Carvalho, a Ara, que se tornaria, oficialmente, em 1942, a sua segunda esposa. Aracy Moebius de Carvalho Guimarães Rosa (nasceu no Rio Negro, Paraná, em 1908 e morreu em São Paulo, em 3 de março de 2011, com 102 anos de idade), uma poliglota brasileira que prestou serviços ao Itamaraty. Durante o período em que permaneceu na Alemanha, Guimarães Rosa teve muita sorte, enfrentando a guerra e escapando da morte. Uma noite, ao regressar para sua casa, encontrou-a completamente destruída.

Durante sua permanência na Europa como Cônsul Adjunto em Hamburgo, consciente dos perigos que enfrentava, sempre contando com a valorosa ajuda de D. Aracy, sua esposa, protegeu os judeus, perseguidos pelo nazismo alemão comandado pelo antissemita fanático Adolf Hitler, e ajudou-os a fugirem do Holocausto e a entrarem ilegalmente no Brasil. Embora postumamente, o governo de Israel homenageou o diplomata e também sua esposa, expressando sua gratidão àqueles que arriscaram suas vidas salvando judeus perseguidos na 2ª Guerra Mundial, pelo terrível nazismo. Assim, em abril de 1985, contando com a presença de D. Aracy, o casal foi distinguido com a mais alta distinção que os judeus prestam a estrangeiros. O nome do casal foi dado a um bosque que fica ao longo das encostas que dão acesso a Jerusalém. Nessa homenagem, D. Aracy declarou que seu marido, devido ao seu alto pudor, sempre se absteve de comentar esse assunto. Dizia apenas: "Se eu não lhes der o visto, vão acabar morrendo; e aí vou ter um peso em minha consciência".

“Em maio de 1956 ocorre o lançamento de ‘Grande Sertão: Veredas’, que causa grande impacto no cenário literário brasileiro. O livro é traduzido para diversas línguas e seu sucesso deve-se, sobretudo, às inovações formais. Crítica e público dividem-se entre louvores apaixonados e ataques ferozes.”

Foi em Grande Sertão: Veredas que Guimarães Rosa aplicou todo o seu extenso conhecimento linguístico, pois o livro é conhecido por sua linguagem inovadora, trazendo vocábulos antigos, misturados com expressões regionais e inclusive a criação de neologismos.

“A partir de 1958, o autor começou a apresentar problemas de saúde e estes seriam, na verdade, o prenúncio do fim próximo, tanto mais quanto, além da hipertensão arterial, o paciente reunia outros fatores de risco cardiovascular como excesso de peso, vida sedentária e, particularmente, o tabagismo.

Em maio de 1963, Guimarães Rosa candidatou-se pela segunda vez à Academia Brasileira de Letras (a primeira fora em 1957, quando obtivera apenas 10 votos), na vaga deixada por João Neves da Fontoura. A eleição deu-se a 8 de agosto e desta vez elegeu-se por unanimidade. Mas não se marcou a data da posse, adiada sine die, somente acontecendo quatro anos depois, no dia 16 de novembro de 1967, data do aniversário de seu antecessor.

Em 13 de novembro de 1967, três dias antes da morte, o autor decidiu, depois de quatro anos de adiamento, assumir a cadeira na Academia Brasileira de Letras. Os quatro anos de adiamento eram reflexo do medo que sentia da emoção que o momento lhe causaria. Ainda que risse do pressentimento, afirmou no discurso de posse: "...a gente morre é para provar que viveu".

Na Academia Brasileira de Letras foi o terceiro ocupante da cadeira nº 2, eleito em 6 de agosto de 1963, na sucessão de João Neves da Fontoura, e recebido pelo acadêmico Afonso Arinos de Melo Franco, em 16 de novembro de 1967.

O escritor fez seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras com a voz embargada. Pareceu pressentir que algo de mau lhe aconteceria. Com efeito, três dias após a posse, em 19 de novembro de 1967, ele morreria de enfarte – encantou-se, subitamente, em seu apartamento em Copacabana, sozinho (a esposa fora à missa), mal tendo tempo de chamar por socorro. Como disse Carlos Drummond de Andrade: “Ficamos sem saber o que era João e se ele existiu de se pegar.

 

 

 

 

 

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