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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

O galeto do Silverinho, as lâmpadas da Cia. Sul Mineira e o português de tamancos. 


O galeto do Silverinho, as lâmpadas da Cia. Sul Mineira e o português de tamancos.

A visão da época foi mais ou menos esta, destacando o coitado do galeto atingido.

 

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Imagem de um verdadeiro par de tamancos. Têm solado de madeira . O local onde ficam os pés são revestidos de couro.

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No final da década de cinqüenta, eu morava na casa de número 306 da Avenida Macedo Soares, em Vila Capivari. Em determinada oportunidade, meu primo Carlos Eduardo Mesquita – que atualmente mora em Pindamonhangaba, com sua família maravilhosa e numerosa, pois só de filhos são cinco –, popularmente chamado de Dedo ou Dedinho, devido ao vício infantil de chupar os dedos, colocando o indicador e o maior de todos na boca, deixando o anular e o mindinho apoiado no rosto – na época morava aqui na Vila Ferraz –, foi passar o dia comigo, lá em casa. Depois do almoço, saímos ali pelas redondezas para um passeio e reconhecimento da área. Claro, naquela época, moleque que era, realmente moleque, não podia deixar de andar com seu estimado estilingue no bolso da calça ou pendurado no pescoço. Nós não éramos a exceção.

Ali nas proximidades, na esquina onde, de um lado, ficava a da casa de propriedade do Sr. Antonio Elias Jacob, onde hoje está sediado o Hotel Europa, e do outro lado, bem em frente a este local, onde hoje está sediado o Center Suíço, ficava a bela casa de propriedade do embaixador José Carlos de Macedo Soares. Essa casa estava edificada num terreno grande e todo arborizado, especialmente com pinheiros, mimosas e pereiras. Naquela época, o caseiro do embaixador Macedo Soares (aquele que toma conta da casa de alguém, especialmente, as utilizadas em finais de semana e em períodos de férias, mediante o recebimento de um ordenado mensal) era o “Seo” Geraldo Silverinho, um Senhor quase negro que lá morava com sua esposa e filho.

O “Seo” Geraldo, que, na época, eu mal conhecia, depois do episódio que vou narrar em seguida, acabou se tornando um grande amigo. Criava no quintal da casa, completamente soltos, uma boa quantidade de belas e saudáveis galinhas e frangos.

Passando pelo local, eu e meu primo avistamos as galinhas e os frangos pastando a grama verde do quintal. Aquela mania de auto-afirmação dos garotos tomou conta de nós, iniciando-se aquele desafio infeliz para ver quem era o melhor, com habilidade e pontaria no manuseio do estilingue. Um disse para o outro: “Duvido que você acerte uma pelotada (ou pedrada) naquele franguinho carijó lá na frente”. O outro não ficou atrás, fez o mesmo desafio. Iniciada a contenda, após algumas poucas tentativas, meu primo Carlos Eduardo, o Dedinho, acertou o coitado do franguinho que, logo, começou a gritar. Imediatamente saímos daquele local.

Em seguida, a contenda não parou. O alvo, porém, já era outro. A aposta agora era no sentido de quem conseguiria acertar uma das poucas lâmpadas existentes nos postes da iluminação pública que, naquela época, de propriedade da Companhia Sul Mineira de Eletricidade – C.S.M.E., concessionária da energia elétrica da cidade e da região, era composta de pequenas lâmpadas incandescentes. Não demorou muito e “plaft!”, um de nós acertou uma das lâmpadas.

Não paramos, fomos caminhando sempre em frente. Subindo uma pequena ladeira das proximidades, chegamos em frente da bela casa de propriedade do Dr. Luiz Eduardo Loureiro, grande advogado em São Paulo. Para nossa surpresa, bem na divisa com a rua, uma enorme ameixeira carregadinha de ameixas amarelas, aquelas que, até hoje, nos dão água na boca só de ver. O único obstáculo que nos separava da ameixeira era uma linda cerca viva de rosinhas coloridas; porém, melhor observando, meu primo viu que embaixo dessa cerca já havia um grande vão que possibilitava a entrada de pessoas que, anteriormente, com a mesma intenção que a nossa, já havia facilitado a entrada ao quintal para acesso às maravilhosas ameixas. Não deu outra: o Dedinho, rápido como ele só, ágil como um corisco, imediatamente já havia passado pelo vão da cerca e já estava em cima da ameixeira. Ele colhia as melhores ameixas e as jogava para mim que estava do lado de fora da cerca, ao lado da rua. Eu só tinha o trabalho de pegar as ameixas e ir estocando nos bolsos.

Em dado momento, quando fui olhar para o chão onde havia caído uma “bitela” de uma ameixa, vi que um senhor gordo, com vasto bigode, saía da dependência onde morava, nos fundos da casa do Dr. Loureiro, e vinha em nossa direção. Imediatamente gritei para o Carlos Eduardo: “Vamos embora, o homem vem vindo!” Ele deu um jeito e rapidamente desceu da árvore, atravessou por debaixo da cerca e, num minuto, já estávamos na rua e perna para que te quero.

Para nossa surpresa, quando já estávamos ali nas proximidades do atual “Market Plaza”, olhamos para trás, e lá vinha o senhor que – depois descobrimos – era um português. Vinha correndo e ofegante atrás de nós. Ele usava um calçado engraçado, muito usado em Portugal, de couro, tipo uma botina e com a sola de madeira, tipo sola de tamanco. Conforme ele corria, a sola de madeira batia no asfalto da rua e fazia um barulho enorme.

Descemos correndo pela Av. Macedo Soares, rumo à nossa casa, que ficava em frente ao atual Hotel Bologna, e toda vez que olhávamos para trás, lá vinha o português correndo atrás de nós.

Ufa! Conseguimos chegar em casa. Nada adiantou. Em pouquíssimo tempo lá estava no portão batendo palmas o danado do português.

Não deu outra. Quem foi atender o português foi meu pai. O português bufava mais que touro bravo, quase não conseguia falar. Depois de algum tempo, já um pouco refeito, conseguiu explicar para meu pai que os dois guris que entraram na casa invadiram a propriedade que fica sob sua responsabilidade e estavam a roubar as lindas ameixas, cultivadas com todo carinho e muito apreciadas pelo seu patrão.

Nem bem havia terminado de contar a história para meu pai e lá chegava, também, o “Seo” Geraldo Silverinho, reclamando que os garotos haviam atirado pedras com estilingue e quebrado as pernas de um dos seus franguinhos de estimação, e fez questão de levar meu pai para confirmar a denúncia.

Quase que imediatamente, chegava no portão da minha casa uma camioneta da Companhia Sul Mineira de Eletricidade. Era o saudoso Armando Ladeira que vinha cobrar as lâmpadas quebradas por nós. O Sr. Ladeira era o gerente local da Sul Mineira, esportista jordanense de grandes méritos, cujo nome, merecidamente, identifica hoje nosso Ginásio Esportivo Municipal; amigo com quem, muito tempo depois destas travessuras de juventude, tive o prazer e o orgulho de trabalhar na gloriosa Companhia Energética de São Paulo – CESP, sucessora da Sul Mineira; era pai do Nelson Ladeira, nosso grande amigo e colega de bancos ginasiais e esportes diversos. Ele havia sido avisado por telefone pelo “Seo” Geraldo Silverinho que moleques estavam quebrando as lâmpadas de iluminação pública.

Bem, o coitado do meu pai ficou numa situação muito difícil, até certo ponto constrangedora. Recebia diversas reclamações contra seu filho e sobrinho e nada podia dizer em nossa defesa.

Concluindo: meu pai acabou assumindo o compromisso de pagar pelo franguinho que teve que ser sacrificado e que, certamente, foi parar numa das panelas da casa do “Seo” Geraldo, talvez na forma de algum ensopado especial e apetitoso ou numa apetitosa farofa de frango, do tipo daquelas que os romeiros levam em seus bornais em suas longas caminhadas e que são saboreadas à sombra de alguma árvore frondosa e próxima a alguma bica de água límpida e cristalina.

Pagou, também, para a Cia. Sul Mineira, por duas lâmpadas quebradas, embora, na realidade, nós só tivéssemos quebrado uma. Porém, todo o histórico dos fatos em nada contribuía a nosso favor.

Quanto ao português, além de receber de volta as ameixas que haviam sobrado em nossos bolsos, aproveitou e cobrou do meu pai alguns cruzeiros, dinheiro da época, como ressarcimento pelas ameixas comidas por nós.

Depois de tudo resolvido a contento, para denunciantes e reclamantes, veio a pior parte da história. Eu, como filho, além de levar uma bronca daquelas homéricas, levei uma surra inesquecível, só interrompida graças à intervenção de minha mãe. Quanto ao Carlos Eduardo, o Dedinho, pelo fato de ser sobrinho, não levou um tapa sequer, somente uma enorme bronca e o comando de se retirar de nossa casa o mais rápido possível.

Claro, depois, numa próxima oportunidade, minha tia Idalina, mãe do Carlos Eduardo, foi comunicada das travessuras que havíamos praticado. Depois de algum tempo do ocorrido acredito que o primo tenha levado algumas broncas e, talvez, alguns tapinhas para que o ocorrido não passasse despercebido.

Coisas de infância e juventude, embora passíveis de altas críticas, devido aos erros injustificáveis cometidos, estão muito longe da gravidade dos casos ocorridos e registrados atualmente, em que a má intenção, a maldade, a criminalidade e o instinto de prejudicar estão claramente evidentes, lamentavelmente. Estas, em via de regra, são situações diversas que, infelizmente, no futuro, jamais poderão ser lembradas com bom humor e com risos. Talvez, em muitas oportunidades, somente poderão ser relembradas com muito choro e desgosto.

Graças a Deus, em nosso caso, muitos anos depois, quando já éramos adultos, ao recordarmos essas e outras passagens de nossa infância e juventude, ríamos muito, inclusive meu saudoso pai que, por mais exigente que tivesse sido, não conseguia guardar, por mais de algumas poucas horas, o rancor de sabor amargo, degustado no momento do recebimento das reclamações e imediatamente após.

Edmundo Ferreira da Rocha

15/07/2001

 

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