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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

Os "concertos" da Violinha 


Os "concertos" da Violinha

 

 

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Violinha era o carinhoso apelido da pobre cortesã que viveu em Campos do Jordão, provavelmente, já entre as décadas de quarenta e sessenta.

Não sei e não consegui saber, até hoje, qual a razão dessa alcunha, porém acredito que seja em virtude da corruptela relativa ao instrumento utilizado em suas transações comerciais e que procurarei explorar a seguir.

Também nunca conseguimos saber de onde veio, se tinha parentes, filhos etc. Denomino-a cortesã (favorita do rei), pois acho injusto, deselegante, ofensivo e muito depreciativo chamá-la por qualquer outro termo designativo da mesma profissão.

Seu nome completo, nunca conseguimos saber. Só sabíamos que era Maria Angélica. Somente pelo nome maravilhoso ela já merece respeito, alcançando o direito de um designativo mais respeitoso.

Da época em que me lembro dela, era uma senhora de idade já um pouco avançada, com certeza, bem mais de sessenta anos. Era baixinha, talvez um metro e cinqüenta, se tanto. Bastante enrugada, trajando-se da melhor maneira possível, sempre com um vestido estampado e um xale cobrindo os ombros, meias pretas, cabelos na altura dos ombros, muito crespo e aloirado com água oxigenada, sapatinho baixo do tipo colegial, com o rosto exageradamente cheio de um creme até brilhante, farta e exageradamente pintado com o chamado “rouge” e lábios pintados com um batom muito vermelho. Ficava nas proximidades da Estação de Vila Abernéssia, ponto de chegada e saída dos bondes da Estrada de Ferro Campos do Jordão que faziam, diariamente, seus horários de chegada e saída entre Pindamonhangaba e Campos do Jordão. Lá estava ela à espera de algum cliente desejoso de seus amores. Às vezes estava acompanhada de alguma outra meretriz mais jovem e disputada pelos jovens e homens daquela época – talvez para utilizá-la como chamariz para facilitar o seu negócio.

Creio que, desses clientes, recebia uns poucos trocados com os quais ia conseguindo viver. Honestamente, não tenho receio em dizer, só não tive algum envolvimento com ela por mera casualidade, talvez por falta de oportunidade e, com certeza, pela falta de dinheiro para remunerá-la, pois esse era o nosso maior problema de juventude.

Não a conheci nos melhores anos de sua vida; porém, pelo visual que tive a oportunidade de conhecer, tudo leva a crer que não deve ter sido muito diferente e privilegiado. Uma coisa é certa, na época em que a conheci, se fosse feito um censo na cidade toda, não se conseguiria um jovem ou homem que tivesse a coragem de afirmar que havia tido um caso sexual com ela, pois achavam que isso seria uma propaganda muito pejorativa; porém, era certo e verdadeiro que muitos foram afinar seus instrumentos sexuais utilizando-se da Violinha como diapasão.

Mesmo assim procedendo, conseguimos descobrir aos poucos, por meio de alguma confissão espontânea e descuidada, gerando muitos arrependimentos, ou por algum amigo que tinha visto alguma coisa, ou, ainda, por informações de terceiros, que muitos homens hoje famosos e importantes e que já ocuparam ou ainda ocupam lugares de destaque em nossa sociedade, assistiram muitos aos “concertos” de afinação da Violinha, utilizando-se de seu instrumento de trabalho, sempre em espetáculos praticados ao ar livre ou nas dependências do Hotel da Lua, como dizia um antigo homossexual de outrora.

Hoje em dia, poucos se lembram desse trabalho importante desempenhado pela dona Maria, a Violinha, responsável por muitas iniciações sexuais dos jovens de outrora e, também, da sua utilização como ponto de fuga de muitos homens do passado. Creio que a Cidade deveria erigir um monumento a ela para ser colocado em algum lugar, para deixar marcada e registrada a sua presença e a sua dedicação a uma das profissões mais antigas da humanidade.

Pode parecer um absurdo, porém, pensem bem. Vocês não acham que ela merece? Afinal, o trabalho que prestou a uma vasta quantidade de homens aqui em nossa Cidade não deveria ser esquecido e, pelo que consta, nenhum daqueles que se envolveram com ela, jamais tiveram problemas que pudessem ter afetado, seriamente, a sua saúde e a sua vida. É possível que alguns tenham sido afetados por alguns gonococos (neisseria gonorrhoeae), a bactéria causadora da gonorréia, doença que, mesmo naquela época já distante, com medicina de recursos limitados, tinha uma cura assegurada e eficaz.

É importante este registro, pois numa época em que o uso do preservativo, tipo camisinha de Vênus, era limitadíssimo e até motivo de constrangimento na hora da compra, não levou seus clientes a situações irreversíveis e terminais, como as de hoje, impostas àqueles desta época atual, quando infectados pelo vírus HIV da AIDS.

Afinal, servir de diapasão para a afinação de instrumentos sexuais durante várias décadas, auxiliar na ereção de inúmeros mastros de tamanhos e espessuras diversas, facilitando para que viessem a se tornar verdadeiros símbolos, respeitados e admirados pelo sexo feminino em suas mais diversas classes sociais, é, sem dúvida, um trabalho, embora comercial, prazeroso, porém cansativo e desgastante, principalmente por meio de “concertos” ao ar livre, enfrentando as mais diversas intempéries do tempo, especialmente aqui em Campos do Jordão, naquela época, onde o frio intenso chegava até a prejudicar o ritmo e os compassos das apresentações levadas a efeito nas dependências do Hotel da Lua, ou, nas emergências, no Hotel do Sol, para atender os mais afoitos e desesperados. Portanto, esse trabalho e dedicação devem ser merecidamente reconhecidos.

Também inúmeros daqueles que viveram naquela época, no mínimo, mesmo que velada e silenciosamente, têm uma dívida para com ela, rezando por sua alma.

Edmundo Ferreira da Rocha

20/01/2000

 

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