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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

ARY DE ANDRADE, MENESTREL DA MONTANHA 


ARY DE ANDRADE, MENESTREL DA MONTANHA

Capa do Livro "Balada de Campos do Jordão" - Autoria de Ary de Andrade

 

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Campos do Jordão foi para Ary de Andrade “a evocação simples e bela de tons quase religiosos, dos amigos que foram buscar saúde e estão mortos”.

Solene testemunho desse sentimento, constitui a “Balada de Campos do Jordão”, de 1942, de autoria de Ary de Andrade. Um canto de dor.

O poema emprestou o nome ao livro “Balada de Campos do Jordão”, publicado em 1942, pela “Livraria José Olympio Editora, Rua do Ouvidor, 110 - Rio de Janeiro.

O autor dedicou a obra a Bastos Portela, Odecio Bueno de Camargo, Januário Miráglia, Jean Arnaud, Aluisio de Paula e José Olympio.

O poema título foi oferecido ao poeta Manuel Bandeira, sendo o livro dividido em quatro capítulos: “Angustia”, “Litania”, “Do Fundo Profundo do meu Coração” “Canto e Prece”.

Ary de Andrade evocou-o na sua "Balada de Campos do Jordão" – "Campos do Jordão, Campos do Jordão, onde sonhou, onde esperou, onde sofreu, onde chorou, seu choro triste e consolado, São Benedito Rodrigues de Abreu."

Túlio Hostílio Montenegro, ensaísta dos literários enfermos também evocou a saga do poeta Ribeiro Couto peregrinando por estações de cura, como a de Campos do Jordão (Abernéssia) - “Campos do Jordão é a paisagem do pulmão”, e bem assim de Ary de Andrade - “Cidadezinha das minhas longas noites, que custavam tanto a passar.”

Sobre o autor de “Balada de Campos do Jordão”, observou Augusto de Almeida Filho em 1942 - “Conheço o poeta há muito tempo.

Sei de suas lutas, do seu heroísmo diante da vida e de sua dignidade humana. Sei, principalmente, de sua angústia divinatória que é a célula mater de toda criação artística. Ary de Andrade sempre foi um lutador (...) Tudo nele era calor, ação, febre de avançar no futuro empunhando o facho da vitória.

Mourejava na imprensa diária. Vieira de Mello, que era redator de “A Nota” contribuiu muito para manter no poeta a chama sagrada do entusiasmo interior (...) Nem mesmo a doença conseguiu abatê-lo. Muito ao contrário, deu-lhe um vigor novo e mostrou lhe o caminho enluarado da poesia.

“Balada de Campos do Jordão” é um livro de convalescença.

“Balada de Campos do Jordão... E é primeiro a terra, a terra que para nos olhos:

Caminhos torturados...
Montanhas altas, altas, tão altas...
Céu azul, de um azul tão suave e transparente...
Vales verdes, verdes, verdes
Onde fios d’água tênues, musicais
Cantam...


E é depois a gente, todas as criaturas que enchem a vida da terra e que se juntam num homem só, num poeta, nesse Ary de Andrade, que sofreu e esperou e veio de lá com a mais pura das orações:

E que minh’alma esteja sempre aberta
Ao coração ferido,
Ao espírito vencido
Do meu irmão mendigo ou sonhador ou desgraçado...
O poeta voltou da morte e viu que o mundo estava morrendo:
Vinde comigo irmão! Vamos construir novo mundo!”


Livro sofrido na solução e no abandono. Livro feito de sangue, de renúncia, de compreensão haurida nas fontes purificadoras da dor. Ary de Andrade teve uma estréia feliz. Só o sofrimento é capaz de uma grande mensagem. E esta mensagem no livro do poeta é o seu encontro com a vida. A revelação da dor é a sua inspiração constante: Musa cuja presença é avassaladora em seus versos (...) E no caminho da montanha, quando alguém for em busca de novos ares, lembrará sempre da litania suave dos Campos do Jordão!”

O escritor Álvaro Moreyra, da Academia Brasileira de Letras, em seu delicioso livro de lembranças “As Amargas, Não...”, em 1954, evocou Ary de Andrade, escrevendo:

“Balada de Campos do Jordão... E é primeiro a terra, a terra que para nos olhos:

Caminhos torturados...
Montanhas altas, altas, tão altas...
Céu azul, de um azul tão suave e transparente...
Vales verdes, verdes, verdes
Onde fios d’água tênues, musicais
Cantam...


E é depois a gente, todas as criaturas que enchem a vida da terra e que se juntam num homem só, num poeta, nesse Ary de Andrade, que sofreu e esperou e veio de lá com a mais pura das orações:

E que minh’alma esteja sempre aberta
Ao coração ferido,
Ao espírito vencido
Do meu irmão mendigo ou sonhador ou desgraçado...


Faz frio na “Balada de Campos do Jordão”. Frio bom, antes do sol chegar. O sol chegou. A alma esperava o sol. E é, então, com a claridade que a aquece, diferente da febre que aquecia o corpo - a poesia da terra, a poesia da gente.

O poeta voltou da morte e viu que o mundo estava morrendo:

Vinde comigo irmão! Vamos construir novo mundo!”

“Nenhuma lembrança lhe foi tão grata nas horas escuras de desânimo, quanto a de Rodrigues de Abreu.

Uniu-os a compreensão das coisas humanas, a tolerância, o conhecimento do próprio estado.

Ambos cheios de motivos de ressentimento, de razões para deixar que se lhes infiltrassem na vida a amargura, a inveja e o rancor, resistiram à sedução da desforra fácil e inútil.

Quase chegaram a aceitar como razoável a morte à espera ao fim da escada. Mas, por que tão cedo?”.

Ambos choraram a sua dor em Campos do Jordão e tão forte foi esse enlace afetivo com o poeta de “Casa Destelhada”, que Ary Andrade dedicou à memória de Rodrigues de Abreu o poema.

Litania de uma Noite de Chuva
A chuva tamborila na vidraça
e um vento violento descabela os arvoredos,
enquanto punhais de relâmpagos rasgam as trevas.


Mas eu estou pensando em todos os desgraçados,
Que têm frio e que andam nas Trevas.
Estou pensando no marujo perdido em meio ao temporal.


Estou pensando em todos os Poetas tísicos,
que sofreram angústia e saudade,
numa noite assim,
numa chuva assim,
e num vento assim.
Em minh’alma também venta outro vento.
E em meus olhos exaustos de esperar bonança
chove outra chuva, quente e mansa de esperança.


Lá fora o vento descabela os arvoredos,
Cujos galhos, como braços negros,
São agitados num espasmo descomunal.
As trevas são dilaceradas
pelos alfanjes dos coriscos.


Tamborila na vidraça
uma chuva fria e fina, fina e fria,
como acúleos finíssimos de aço.


Mas estou pensando em todos os Poetas tísicos
que sofreram frio, angustia e saudade
numa noite tão negra,
numa chuva tão gélida
e num vento tão mau...


“Balada de Campos do Jordão” Ary de Andrade - 1942

Campos-do-Jordão! Campos-do-Jordão!
Caminhos torturados
como a alma dos desesperados.


Montanhas altas, altas, tão altas,
que lembram os meus sonhos deslumbrados.


Céu azul, de um azul tão suave e transparente,
como a pureza das mocinhas invioladas,
que dormem seu sono sem sonhos
no solo gelado de tuas alturas.
Campos-do-Jordão! Campos-do-Jordão!


Vales verdes, verdes, verdes
onde fios d’água tênues, musicais,
cantam a eterna canção d’água corrente,
que, como a esperança,
não cansa
e não descansa
de ser mansa,
de ser boa
e de esperar.


Campos-do-Jordão! Campos-do-Jordão!


Das meninas brancas,
das crianças leves,
das mulheres diáfanas
como os sonhos bons.


Campos-do-Jordão! Campos-do-Jordão! Porto seguro de naus desarvoradas,
de anseios moribundos, de tantos corações.


Campos-do-Jordão, cheio de luz.


Campos-do-Jordão, onde encontrei Jesus.
O Jesus que eu havia perdido
pelos caminhos da minha dor.
O Jesus que me apareceu um dia
no sorriso bom, no sorriso luminoso,
de um irmão de Francisco de Assis.
O Jesus que leniu meu sofrimento,
que adoçou minha agonia.
Este Jesus que ficou comigo...
Para a vida e para a morte!


Campos-do-Jordão, de Paulo Setúbal!
Campos-do-Jordão de Ribeiro Couto!
Campos-do-Jordão, Campos-do-Jordão,
onde sonhou
onde esperou
onde sofreu
onde chorou
seu “choro triste e consolado”,
São Benedito Rodrigues de Abreu.


Cidadezinha das angústias,
cidadezinha das minhas agonias,
cidadezinha das minhas longas noites,
que custaram tanto a passar,


Ficarás na minha memória,
cidadezinha das minhas lágrimas,
cidadezinha dos esquecidos,
cidadezinha dos condenados,
cidadezinha das dores sem nome,
dos desesperos infernais.


Ficarás na minha lembrança,
diante dos olhos nevoentos da minha saudade,
com teu cemitério cercado de ciprestes,
onde repousam para o Sempre e para o Nunca Mais,
meus companheiros, meus amigos, meus irmãos.


Cantarás na minha memória!
Vibrarás na minha saudade!
Viveras na minha vida!


Pois teu nome, qual um sino,
qual um grande coração
está pulsando
e bimbalhando
agora e sempre, agora e sempre, agora e sempre,
na minha memória, na minha lembrança, na minha saudade.


Campos-do-Jordão, Campos-do-Jordão
A badalar, a badalar desesperadamente:
Dalããão...
Dalããão...
Dalããão...


Campos-do-Jordão, Campos-do-Jordão
a bater, a bater, a bater, com o meu coração:
Jordão...
Jordão...
Jordão...
Jordão...

10/03/1942

 

Acesse esta crônica diretamente pelo endereço:

www.camposdojordaocultura.com.br/ver-cronicas.asp?Id_cronicas=226

 

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