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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

Meu Natal inesquecível 


Meu Natal inesquecível

À esquerda a linda árvore de Natal que a amiga Nara fez, com as balas de coco, embrulhadas em papel impermeável.

 

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OBSERVAÇÃO: Esta é uma história verídica, contada em detalhes reais.

Era o mês de dezembro do ano de 1948.

Morávamos em uma minúscula casa de madeira, nos fundos de uma propriedade pertencente ao meu avô paterno – hoje propriedade da Irmandade do Sagrado Coração de Jesus. Era feita com tábuas de pinho de Campos do Jordão, com frestas fechadas com ripas da mesma madeira, todas enegrecidas pelo tempo, sem nenhum tipo de pintura; tinha apenas um quarto e uma pequena cozinha com as paredes escurecidas pelo alcatrão destilado por meio da queima da madeira utilizada como combustível de um rústico e velho fogão de taipa. Havia uma mesa rústica e um banquinho de madeira.

Éramos uma família de três pessoas: eu e meus pais.

Meu pai, de profissão carpinteiro, trabalhava em uma empreiteira de construção civil de propriedade de um cunhado, meu tio (de nome Floriano Rodrigues Pinheiro, o mesmo que tem seu nome, com grande merecimento, eternizado na rodovia SP-123, a que liga Campos do Jordão à via Dutra).Na época, afastado do serviço, através do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários – I.A.P.I., por causa de problemas de saúde (angina pectoris), ainda não recebia nenhum tipo de pensão, pois passava por um período de comprovação de sua incapacidade para o trabalho, o que só veio a ocorrer muitos anos depois. Somente uma reduzida ajuda financeira, por parte do cunhado (meu tio), mantinha as mínimas condições de sustento de nossa pequena família.

A vida era muito difícil e passávamos muitas necessidades. Nosso sustento, em certas épocas do ano, era fartamente reforçado pela pêra, pelo chuchu e pelo pinhão que, generosamente, abundavam em nossa Campos do Jordão. Alimentos até hoje sagrados para nós. Fora dessas épocas, lembro muito bem, meus pais, várias vezes, até chegaram a se privar de alguma alimentação para que eu não passasse forme. Nessa época, eu tinha quase cinco anos de idade – seriam completados no dia 19 de dezembro.

Eu era apaixonado pelas árvores enfeitadas com as bolinhas multicoloridas e brilhantes que, revestidas de envolvente mistério, adornavam as casas e o pequeno comércio da cidade, para comemorar o Natal. Eu ficava maravilhado com elas. Sempre que via essas árvores decoradas para o Natal, eu falava para a minha mãe:

– Mãe, eu gostaria muito de ter uma árvore dessa em minha casinha.

Ela me olhava com muita ternura e, com certo embargo, dizia: – Filho, um dia, se Deus quiser, você vai ter a sua árvore de natal.

Nossa situação financeira era muito apertada e difícil e não permitia essa vaidade. Era impossível a compra das bolinhas para enfeitar qualquer árvore de Natal, por mais simples que fosse.

Alguns dias antes do Natal daquele ano, eu fui com minha mãe a um minúsculo “Armazém de Secos e Molhados” que tinha perto de nossa casa, de cujo nome me lembro ainda: “Mercadinho Jordanense”, cujos proprietários, posteriormente, tornaram-se grandes amigos. Lá ela comprou, com o único e reduzido dinheiro que tinha, um coco e quatro folhas de papel impermeável, nas cores, azul, vermelha, verde e amarela. Eu nem podia imaginar qual era sua intenção.

No dia seguinte, lembro, ela quebrou o coco, retirou as cascas e separou toda a sua alva polpa. Posteriormente, ralou essa polpa, juntou água fervente, espremeu toda a polpa e separou somente uma espécie de leite de coco. Juntou açúcar, colocou em uma panela e deixou ferver, tomando o cuidado para não deixar derramar. Depois de muito tempo, retirou a panela do fogo, tirou toda aquela massa (calda espessa) superquente e a despejou em cima da pedra da pia. Aos poucos, evitando se queimar com o calor da massa, começou a pegá-la e a puxá-la, esticando-a a ponto de formar verdadeiro cordão, e ia dobrando inúmeras vezes e esticando novamente. Eu perguntava:

– Mãe, o que você está fazendo?

E ela respondia:

– Um pouco de bala de coco, filho.

Já cansado de observar, resolvi sair do interior da casa e fui ao quintal brincar um pouco, sozinho, é claro, pois nas imediações existiam poucas crianças. Lá fiquei por um bom tempo, não sei precisar quanto, talvez umas duas horas ou mais. Quando entrei em casa... uma surpresa maravilhosa e inesquecível! Em cima da rústica mesinha de madeira lá estava ela, a minha tão almejada, a mais linda, maravilhosa e inesquecível árvore de Natal de toda a minha vida.

Assim como eu, minha mãe e meu pai não escondiam a felicidade daquele raro momento. Ríamos e chorávamos muito, ao mesmo tempo, de alegria.

Minha querida mãe, com muita criatividade, carinho e amor, satisfazia de maneira ímpar, singular, magistral e histórica a grande e maior vontade de seu único filho, na ocasião.

Com muita simplicidade, pegou uma velha lata (lata de tinta de 3 litros – galão), encheu-a de terra e decorou-a externamente com papel impermeável. No seu centro inseriu um pequeno, porém, soberbo e vistoso galho verde, de pinho bravo, essência abundante em nossa cidade naquela época. Em seus ramos havia pendurado todas as balas de coco que ela, carinhosa e habilmente havia feito, embrulhadas, uma a uma, no papel impermeável multicolorido, que tinha um brilho maravilhoso e inesquecível, muito superior ao das bolinhas de vidro espelhadas, usualmente utilizadas para essa finalidade.

Claro que minha mãe, na noite anterior, enquanto eu dormia, já havia tomado algumas providências imprescindíveis e necessárias para possibilitar a concretização da surpresa que estava preparando. Tinha cortado todo o papel impermeável de cores diversas, em pedaços uniformes. Também havia decorado a lata para utilizá-la como base da árvore de natal. Com o galho de pinho bravo cortado por meu pai, já tinha deixado a árvore de natal montada, escondendo-a atrás da cama para que eu não a visse antecipadamente.

No dia seguinte, enquanto eu brincava no quintal, absorvido pelas fantasias infantis, ela terminou de fazer as balas de coco, cortou-as e embrulhou-as no papel impermeável e pendurou-as na árvore.

Assim, aconteceu o “Meu Natal Inesquecível”.

Esse menino cresceu e, hoje, passados mais de cinqüenta anos, lembra-se desse episódio marcante de sua vida com muita saudade e emoção.

Sem dúvida, um grande exemplo de amor, de dedicação, de simplicidade e de maternidade. Exemplo simples que marcou e auxiliou esse menino em toda sua formação, cristalizando seu caráter.

Oxalá a juventude atual possa extrair, das coisas mais simples, exemplos duradouros e marcantes que os transformem em homens e mulheres de bons costumes, desprovidos de vaidades fúteis, e ricos de amor e responsabilidade para com o futuro.

* * * * * * * * *

Só para dar um desfecho nesta história, após aquela data. Graças a Deus, nossa vida mudou muito. Meu Pai, devido aos problemas de saúde, deixou de trabalhar como carpinteiro e dedicou-se à corretagem de imóveis, com o que obteve algum sucesso, possibilitando uma mudança radical em nossa condição de vida. Hoje, embora já sem meu pai, somos uma família realizada, culturalmente, profissionalmente, estruturalmente e financeiramente.

Em duas oportunidades já fizemos a reconstituição daquela árvore de natal. Em uma dessas oportunidades, a reconstituição foi feita por uma querida e estimada amiga, a NARA (Amanda Nara Ciaramelo Alves Pinto, hoje morando na cidade de Atibaia-SP) que, tomando conhecimento dessa história, secreta e sigilosamente providenciou toda a montagem, dando-nos a oportunidade de reviver, com grande emoção, ou até com muito maior emoção, aquele momento maravilhoso e inesquecível.

No dia 13 de junho de 2003, minha mãe Odete, completou 80 anos de idade (eu, neste ano de 2008, completarei 65 anos de idade) e, nessa oportunidade, embora emocionadamente, fiz questão de relembrar essa passagem histórica e inesquecível de nossa vida, na presença de meus irmãos, minha filha, esposa e sobrinho, que vieram muito tempo depois daquele Natal inesquecível.

Aguardo ansioso a oportunidade de contar esta linda história para minha querida Netinha Yris que, em 2008,está com dez meses de idade.

Edmundo Ferreira da Rocha

23/12/1994

 

Acesse esta crônica diretamente pelo endereço:

www.camposdojordaocultura.com.br/ver-cronicas.asp?Id_cronicas=35

 

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