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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

CAMARGO FREIRE – Sua sala de desenho e a “SUMOC” 


CAMARGO FREIRE – Sua sala de desenho e a “SUMOC”

Auto-retrato do Pintor Camargo Freire

 

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A partir do final da década de 50, contando com a maravilhosa iniciativa, cuidados especiais, rigorosos para a época, o professor Expedito Camargo Freire, mestre da Cadeira de Desenho, idealizou, decorou e preparou uma sala de aula do Colégio Estadual e Escola Normal de Campos do Jordão – CEENE, para poder ministrar, com muito carinho, atenção, dedicação e competência, as aulas de sua cátedra.

Em uma sala normal, foram substituídas as carteiras escolares, comuns e tradicionais, por pequenas pranchetas, especialmente projetadas pelo mestre Camargão, como era gentilmente chamado pelos alunos, adaptadas para comporem uma sala de aula, sem que houvesse a redução da quantidade de alunos estabelecida por classe de aula. Essas pequenas pranchetas eram muito práticas, possibilitando a adaptação da posição de sua mesa, colocando-a em qualquer posição mais favorável a cada aluno.

As mesas dessas pranchetas eram todas recobertas com um plástico grosso, de cor verde-água (acredito que esta é a cor que melhor o define), facilitando a limpeza e impedindo que a madeira fosse, aos poucos, sendo prejudicada com a pressão do lápis ou de outros materiais utilizados nos desenhos ali executados e, também, impedindo a ação vandálica de muitos alunos.

As pranchetas foram feitas em marcenaria de Campos do Jordão, sendo utilizada a madeira denominada pinho do Paraná, extraída do pinheiro tipo “Araucaria angustifolia”, essência muito abundante, na época, naqueles rincões paranaenses. A sala de aula teve suas paredes, fina e delicadamente decoradas pelo mestre Camargo Freire, com todo o requinte e qualidade de sua arte de pintor já renomado, reconhecido e premiado em salões de artes plásticas, nacionais e internacionais. A parede da frente da sala, acima do quadro-negro, foi totalmente decorada com motivos de desenhos de formas geométricas, tipos de linhas, traços etc. A parede lateral, do lado direito da sala, para quem olhava para o quadro-negro, tinha uma novidade, mais um quadro-negro. Esse quadro era utilizado pelo mestre Camargo para a elaboração de alguns desenhos mais específicos e relacionados a cada uma das aulas que ministrava. Eram desenhos renováveis e que, com freqüência, eram substituídos de acordo com o tema a ser abordado em cada aula. Na parte superior, acima desse segundo quadro-negro, a parede foi totalmente decorada com diversos tipos de faixas decorativas, rosáceas, barras decorativas, grupos de pássaros e peixes. Na parede dos fundos da sala de aula, o mestre Camargo Freire exagerou: pintou dois quadros enormes e maravilhosos, com motivos da pré-história, contendo as armas e os homens primitivos na caça aos mamutes (ancestrais do nosso admirado e enorme paquiderme, o elefante). Ao centro, entre esses dois quadros, ele emoldurou um retângulo com linhas decorativas e pintou o centro de branco. Mais uma novidade do mestre Camargão. Esse espaço era uma tela, especialmente preparada para a projeção de filmes, na época o Super 8 mm, ou para a projeção de slides fotográficos, sempre com a constante preocupação de tornar suas aulas, didaticamente, mais atraentes e interessantes, fazendo valer, assim, a grande máxima oriental: “Uma imagem vale mais que mil palavras”.

Enfim, era uma sala totalmente ambiental, onde todas as suas paredes disponíveis foram utilizadas para a composição da sala de aula. Todos os motivos utilizados em sua decoração foram habilmente escolhidos com muita sabedoria e propósito, para serem usados na ilustração de suas magníficas aulas.

Com muito capricho, procurando melhorar ainda mais o ambiente de sua sala de aula, o mestre Camargo dotou-a de um pequeno sistema de som que contava com a “coqueluche” da época, a rádio FM (Freqüência Modulada). Assim, suas aulas eram valorizadas com o som ambiente de músicas em freqüência modulada, tipo “Scala FM” que, na época, praticamente só tinha músicas e, raramente, comerciais.

Eram aulas maravilhosas, não só pelos atributos da sala, supramencionados. O próprio mestre Camargo Freire era maravilhoso. Com seu físico avantajado e até acima do peso normal, com seu tipo acaboclado e sotaque de homem simples, até bastante acaipirado, puxando em demasia os “erres”, dava verdadeiros “shows”, com suas piadas muito simples, espirituosas e muito bem-humoradas. Dávamos gostosas gargalhadas quando contava as piadas. Sua feição se modificava, ficava alterada, pois procurava adaptá-la a cada um dos personagens dessas piadas, durante suas encenações. Muitas vezes, sua cara era melhor motivo para risos do que a própria piada.

Nessa época, o mestre Camargo instituiu um controle em sua sala de aula. Era um acompanhamento que visava registrar o comportamento de cada aluno dentro da sala. Esse controle, que ele denominava de “SUMOC”, mesma sigla que, na época, era usada pela Superintendência da Moeda e do Crédito, do Governo Federal, responsável pela fiscalização geral da nossa moeda, correção monetária, juros, câmbio etc. Até acredito que ele tenha dado um significado jocoso para a sigla utilizada na sala de aula; porém, por mais que tenha me esforçado, não consigo lembrar corretamente – acredito que era algo mais ou menos assim: “Sistema Único de Medição da Ociosidade da Classe”. Meus colegas da época, também, muito menos que eu, não lembram, lamentavelmente. No seu SUMOC, o mestre Camargo ia anotando, num canto da lousa, o nome de cada aluno que se excedia em brincadeiras na sala, deixando de prestar atenção na aula. Pelo comportamento irregular, ia anotando na frente de cada nome uma barrinha. O aluno que, no final do mês, atingia um total de cinco barrinhas, tinha a sua nota mensal “corrigida monetariamente”, como ele próprio dizia, sendo reduzida em um ponto (na época, a nota já era variável de zero a dez). Também o aluno que atingia essa marca era passível de ser encaminhado à diretoria para admoestação e, posteriormente, formalizada na caderneta escolar, que deveria retornar com a ciência dos pais ou responsável pelo aluno.

Para os alunos que, porventura, não tivessem nenhuma “correção monetária” negativa, em sua nota mensal, havia, ao contrário, uma “correção monetária” positiva em sua nota mensal, sendo acrescida de um ponto. Nos casos excepcionais, de ótimo comportamento no semestre, premiava os alunos com a distribuição de um bombom “sonho de valsa”.

Muita saudade desperta a lembrança dessa sala de aula magnífica que ainda existe no prédio onde, atualmente, está sediada a Escola “Tancredo de Almeida Neves”, ex- Funcamp, como ficou conhecida, porém sem as tradicionais e maravilhosas pranchetas de desenho das quais, lamentavelmente, nem sabemos o paradeiro. Saudade do eterno e maravilhoso mestre, magnífico amigo, incomparável ser humano, dotado de qualidades raras, de uma simplicidade ímpar, de uma bondade sem igual e de uma capacidade e habilidade para o desenho e a pintura, próprias dos grandes gênios das artes plásticas.

Costumamos dizer que, nesta vida, ninguém é eterno e insubstituível. Pessoas raras são real e inquestionavelmente insubstituíveis. O nosso querido mestre Expedito Camargo Freire, o Camargão, foi uma dessas pessoas insubstituíveis. Suas qualidades pessoais, seu jeito de ser, sua eterna jovialidade, sua capacidade profissional, sua habilidade com o desenho e a pintura, dificilmente, poderão ser igualadas e substituídas. ELE ERA ÚNICO.

Hoje, deve estar decorando lugares especiais, lindos e maravilhosos, no Paraíso celestial, talvez, alegrando anjos, prestando seus serviços de mestre em pintura e artes plásticas ao Eterno Criador.

Edmundo Ferreira da Rocha

29/04/1994

 

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