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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

O estilingue da discórdia eterna 


O estilingue da discórdia eterna

Esta imagem define bem o que é estilingue e como era feito.

 

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Um simples estilingue gera eterna discórdia entre amigos de outrora

Recentemente, visitando um grande e querido amigo, relatou-me ele o seguinte fato acontecido em Campos do Jordão, talvez, no final da década de 1950 ou início da década de 1960.

Contou-me que um tio muito habilidoso em trabalhos manuais gostava de fazer estilingues, também conhecidos por atiradeiras ou baladeiras, brinquedo usado antigamente como arma primitiva, principalmente por garotos, para atirar pequenas pedras, especialmente escolhidas, quase uniformes, para fazer pontarias, atingindo objetos diversos, como lâmpadas das vias públicas, placas de sinalização, frutos diversos, vidraças, animais e, infelizmente, até para atingir e matar indefesos passarinhos, algumas e poucas vezes utilizados como alimento.

Seu tio tinha a paciência de ir a determinadas matas, existentes nas proximidades do local onde morava, escolher pequenos arbustos com tipos de madeira resistente e que mostravam a formação de forquilhas simétricas (forcado de três pontas/galho ou haste bifurcada em forma de “Y”) quase perfeitas, cuja parte de baixo é usada como cabo. Chegava a ponto de, com muita habilidade e paciência, amarrar as pontas bifurcadas de algumas forquilhas, de tal forma que corrigisse eventual má formação, mesmo que fosse obrigado a colocar alguns calços de madeira ou até pequenas pedras entre elas, forçando assim a esperada correção. Periodicamente, ia aos locais verificar se as correções estavam acontecendo a contento e se as forquilhas já estavam no ponto de serem retiradas cuidadosamente. Caso positivo, cortava ou serrava as forquilhas nos locais certos, sempre deixando algumas sobras. Levando-as para sua casa, colocava-as para secar à sombra, em local especial, evitando a luz e o calor direto do Sol.

Quando já estavam no ponto de ser trabalhadas, serrava ou cortava definitivamente nos locais corretos, sempre procurando manter a melhor forma simétrica e proporcional entre o cabo do estilingue e as pontas bifurcadas. Mantinha a casca no cabo e em boa parte das bifurcações, só retirando, com muito cuidado, a casca dos locais onde seriam amarrados os elásticos. Lixava a forquilha cuidadosamente, com lixa bem fina, para não comprometer a qualidade das cascas.

Ia até uma selaria existente no centro da Vila Abernéssia e lá conseguia retalhos de couro, usados para fazer sapatos e, com eles, confeccionava a peça que servia como contendor, a parte do estilingue destinada a abrigar a pedra a ser atirada. Essa peça, com aproximadamente dez centímetros de comprimento e quatro centímetros de largura, com duas pequenas aberturas nas extremidades do comprimento, no sentido da largura, menores que esta, utilizada para passar e dobrar os elásticos a serem nela fixados com amarras especiais.

Na época, em alguns postos de gasolina, especializados em consertos de câmaras de ar de automóveis, conseguia pedaços especiais de borracha e deles extraía cuidadosamente, com auxílio de tesouras bem afiadas, pares de elásticos com, aproximadamente, pouco mais de um centímetro de largura e quarenta ou quarenta e cinco centímetros de comprimento.

Dessa câmara de ar, também com o auxílio da boa tesoura, conseguia retirar tiras bem finas, com aproximadamente dois ou três milímetros de espessura, para serem utilizadas para amarrar, de maneira bastante especial, os elásticos à forquilha de madeira comumente chamada de gancho e à tira de couro que iria abrigar as pedras a serem atiradas.

Assim, conseguia fazer estilingues memoráveis, de dar inveja a todos os demais garotos amigos que moravam nas redondezas ou até longe do local onde morava.

Em determinado dia, um garoto amigo, um pouco mais novo que seu tio, ficou maravilhado com um dos estilingues fabricados por ele. Queria comprar o estilingue a todo custo, porém seu tio não vendia por dinheiro algum.

Com muita insistência conseguiu fazer que o tio emprestasse o estilingue para ele, mediante a promessa de devolvê-lo no dia seguinte.

Os dias passaram. O garoto jamais devolveu o estilingue para seu tio, que ficou uma fera de raiva, porém nunca foi tirar satisfações, somente passou a ignorar o garoto, deixando assim de contar com sua amizade.

Os anos passaram. Hoje, mais de cinquenta anos desse lamentável episódio, os dois moram em cidade vizinha a Campos do Jordão. Muitas vezes já se encontraram em algum lugar da cidade. Jamais voltaram a olhar um para o outro. Nunca mais se cumprimentaram. Também nunca tiveram ímpeto de conversar e esclarecer a lamentável falha, em algum momento de paz e harmonia, após tantos anos passados, propiciando a um o pedido da devida e necessária desculpa e, ao outro, aceitá-la, reatando a antiga amizade com um forte e caloroso aperto de mãos, agradecendo a Deus por estarem vivos, esquecendo assim que um simples estilingue tivesse sido a forte causa da infeliz e eterna discórdia entre amigos de outrora.

Edmundo Ferreira da Rocha

20/09/2009

 

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