Home · Baú do Jordão · Camargo Freire  · Campos do Jordão

Crônicas e Contos · Culinária  ·  Fotos Atuais · Fotos da Semana

  Fotografias · Hinos · Homenagens · Papéis de Parede · Poesias/Poemas 

PPS - Power Point · Quem Sou  · Símbolos Nacionais · Vídeos · Contato

Oscar Ribeiro de Godoy

 

Nossa luta pela posse da Guarda

 

Luta pela posse da Fazenda da Guarda

 

Dada a situação irregular pela posse da terra em Campos do Jordão, o senhor Domingos Jaguaribe, grande possuidor de terras, requereu a divisão judicial de toda a gleba. Praticado os trâmites legais, iniciam-se os trabalhos de campo pelo engenheiro José Magalhães, o qual encontraria inúmeros obstáculos.

Já com os seus serviços quase ultimados, Dr. Magalhães alcança as terras de João Rodrigues da Silva, apelidado de João Maquinista. De origem portuguesa, esse homem era rude, sem cultura e vivia há anos ao lado da igreja, no trabalho tranqüilo de seu armazém na Vila Jaguaribe, fartamente abastecido para a época. O engenheiro, desejando prosseguir nas suas medições, atravessa cercas e avança em bens do João Maquinista, que julgou um ultraje o pisar nas suas propriedades e, após alterada discussão, mata o profissional com um certeiro tiro a queima-roupa. Só em 1907 retoma-se a demarcação das divisas de terras, uma vez que esse triste acontecimento trouxe a paralisação dos trabalhos por alguns anos.

Nessa mesma época, a firma Société Commérciale et Financière Franco-brésilienne, proprietária em São Paulo da Casa Nathan, um comércio de máquinas agrícolas, adquiriu uma área de terras que se localizava onde hoje estão os remanescentes do Grande Hotel e arredores e requereu que se retomassem as demarcações.

Nesse processo de retomada das demarcações, meu pai não foi citado no edital de convocação dos condôminos, mas sim meu avô que já não era mais proprietário em Campos, sendo ele esbulhado de grande parte do que possuía, pois os documentos rezavam a posse da citada parte de Campos, integrando cada uma das duas fazendas vizinhas, ambas compradas pelo meu bisavô, em um só título, do filho do Brigadeiro Jordão, que herdara a quarta parte de toda a área.

Formara-se um verdadeiro complô para usurpar grande parte de nossa fazenda, a Guarda; e os meus antepassados viram-se no dever de, para assegurar os seus direitos, tentar a nulidade da sentença que punha a termo a divisão. Foram três anos de processos jurídicos e traições diversas.

Em 1912 falece meu pai, deixando minha mãe e dois filhos, um com 9 e outro com 7 anos. Não havia na época INSS e nenhuma outra forma de proteção aos promotores de Justiça, função exercida por meu pai em Mogi das Cruzes.

Então, o único bem que possuíamos, a fazenda da Guarda, estava nas mãos do depositário público fiel ao grupo ganancioso, que, como conseqüência do ocorrido, já se considerava dono e dispunha da propriedade a seu bel prazer.

Por informações obtidas no Supremo Tribunal, na época no Rio de Janeiro, ficamos informados de que a causa estava perdida. Perdêramos os principais prazos. O julgamento não entraria no mérito da viuvez de minha mãe e, segundo as palavras de um dos julgadores, na causa seríamos vencidos.

O nosso débito era mais ou menos de 12 contos de réis devido pelo processo, como pagamento do agrimensor na divisão. Mas, pela solidariedade e fraternidade da família, conseguimos recuperar a fazenda, ainda que nos conformando com a perda de vultuosa área e de outros bens constantes do esbulho.

A sede da Comarca era em São Bento do Sapucaí, é de se avaliar o quão penoso tornava-se vir de São Paulo, montar a cavalo em Pinda e ali chegar para fazer uma petição ao juiz. Pois isso era feito com freqüência pelos bacharéis Otaviano M. Machado e Trajano M. Machado. O primeiro cunhado e o outro irmão de minha mãe, Maria da Glória Ribeiro de Godoy, conhecida por um longo tempo como Dona Sinhazinha. Os dois trabalhavam pelo afeto devotado aos sobrinhos e à minha mãe, e nada ganhavam nas desgastantes idas e vindas a São Bento.

Satisfeitas as exigências legais, obtido o alvará de destituição do depositário público, viemos a São Bento e ficamos esperando o momento exato, em uma fazenda em Santo Antônio , pertencente a um parente próximo, Cel. Jorge M. Machado e, hoje, em mãos de herdeiros do Engenheiro Magalhães. Tudo pronto, formou-se uma caravana para retomar a Guarda. O grupo era formado por meus dois avós, Manuel Ribeiro Marcondes Machado e Amador Bueno de Godoy Moreira, minha mãe, seus dois filhos, seu irmão Trajano, o Oficial de Justiça, camaradas e burros de carga.

Da Vila até a Guarda, o caminho era mais ou menos o mesmo até o Ribeirão do Fojo. Passado o vão, logo à direita, começava-se a subir o morro e, assim, num desgastante sobe e desce, passando por morros tão íngremes que um deles era chamado de Corta Rabicho, alcançava-se o Ribeirão do Meio ou Canhambora, em seguida o da Casa Velha e, margeando o rio Sapucaí, divisávamos a frente o imponente velho casarão da Guarda.

A nossa chegada imprevista causou tremendo abalo e produziu espetacular corre-corre. O depositário, parentes e amigos desfrutavam da fazenda como donos. Sendo apresentada pelo Oficial de Justiça a sentença que suspendia o seu mandato, ele mal pôde se sustentar sobre as pernas, pois tremia da cabeça aos pés.

Estavam ali, a convite do suposto dono, um desembargador de São Paulo, seu filho enfermo de tuberculose e sua família. Com a nossa chegada, quis ele imediatamente sair, mas, a nosso convite, ficaram, e tornamo-nos amigos, convivendo em nossa casa por algum tempo.

Assim, recuperamos a Guarda sob a chefia de nossa mãe, valorosa mulher que se entregou bravamente à administração da propriedade com energia e desenvoltura invejáveis que lhe permitiram granjear o respeito e a admiração de todos.

 

 

 

 

Voltar

 

- Campos do Jordão Cultura -