Meus
Avós
Avô
do Dr. Oscar - Dr. Manoel Ribeiro Marcondes
Machado na Fazenda da Guarda.
Homens
de velha cepa, adoravam esta terra e sempre nos
acompanharam nas viagens para cá, desde a
retomada da nossa fazenda após a suspensão da
penhora, até os seus últimos dias.
Manuel
Ribeiro Marcondes Machado, em 1865, quando se
iniciou a Guerra do Paraguai, como acadêmico de
medicina, freqüentando o 6º ano, foi aceiro como
médico auxiliar. Ainda tenho em mãos a carta
dirigida a seu irmão pedindo para que obtivesse a
autorização do pai para a aventura em que se
metera, pois, segundo dizia a carta, não teria
coragem de fazer o pedido e, quando a carta
chegasse, já estaria em plena campanha.
Na
guerra trabalhou em hospitais de frente como acadêmico
auxiliar nas funções de médico. Ali adquiriu
grande experiência e valiosa capacidade de
improvisação. Eram comuns os casos de amputação
e ligadura de vasos, tudo feito sem anestesia e
sob ensurdecedora gritaria dos pacientes. O que
aprendeu nas lidas da guerra lhe valeu muito
quando, na Guarda, era chamado para atender casos
difíceis. No caso de caboclos com anemia, por
exemplo, meu avô os mandava beber água de
ferradura enferrujada.
Certa
vez, meu avô improvisou uma cirurgia para salvar
uma moça que tentara o suicídio seccionando o
pescoço com uma faca. Ao receber o chamado na
Guarda, preparou o material cirúrgico: no fogo,
curvou uma agulha de costura, tirou alguns fios da
crina do rabo de um cavalo para as suturas, afiou
facas e canivetes e poliu alicates na carpintaria.
Tudo foi levado a ferver e depois envolvido em
toalhas limpas (ainda não havia plástico naquela
época). Com essa precariedade de higiene e
esterilização, montou a cavalo e se dirigiu para
o local, acompanhado por mim e por mais alguns
empregados.
Chegando
lá, vimos o cômodo coberto de sangue por todos
os lados, e pelo estado da moça, o caso nos
pareceu muito grave. Meu avô entrou e nós
ficamos do lado de fora da casa, na expectativa.
Algum tempo depois, ele saiu do casebre e disse:
“Desta ela se salva”. A experiência da guerra
permitia-lhe fazer esses milagres terrenos.
Já
meu avô paterno, Amador Bueno de Godoy Moreira, não
era amigo de trabalhos manuais, salvo a varredura
de terreiros. Preferia caçada de veado e perdiz,
no que era exímio. Conta-se que recebera na
Guarda o Conde D’Eu para uma grande caçada.
Ainda jovem cheguei a participar de uma dessas
aventuras. Selecionavam-se cavalos fortes e
espertos cachorros especializados na caça. Os
animais eram muito bem alimentados e cuidados com
carinho.
Conhecidas
as “esperas”, lugares onde a caça deveria
passar, ali ficavam os caçadores aguardando o
sinal dos cães. A tocaia durava horas e a caça só
passava em uma das “esperas”. Por isso, o caçador
não podia perder o tiro. A passagem do bicho era
num relâmpago e “tiro perdido, festa
acabada”.
Em
Pinda, onde morou por muitos anos, possuía um
sobrado defronte à matriz da cidade, numa
esquina. Foi, nesse tempo, Coronel da Guarda
Nacional do Império e teve, no exercício das
suas atividades militares, grande respeito e a
admiração dos conterrâneos. Casou-se duas
vezes, sendo que, no primeiro casamento, teve dois
filhos: meu pai e meu tio, o Ministro Godoy
Sobrinho. No segundo casamento, teve mais cinco
filhos, entre eles o escritor Baltazar de Godoy
Moreira, Maria, Belinha, Pedro e Amador.
Passava
os dias, já na velhice, cantarolando um ruído
interminável que não tinha palavras nem sentido.
Era só um tal de “hum... hum... hum...” com
certa entonação e com altos e baixos da voz.
Por
último, meu avô viveu em São Paulo e veio a
falecer quando morava na Rua Guaicurus, na
proximidade do Tendal Municipal. Foi dele que
herdamos a Fazenda da Guarda e, graças a ele,
aprendemos a conservar e amar este pedaço de
terra.
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