A cura pelo clima jordanense
Dr. Raphael de Paula Souza, grande médico pneumologista, um dos fundadores dos "Sanatorinhos" e Diretor Clínico do Sanatório São Paulo de Campos do Jordão.
O renomado pneumologista Raphael de Paula Souza escreveu, em 1935, que no Brasil a indicação de clima de altitude, como fator de cura da tuberculose, era bastante antiga.
Sigaud, que clinicara no Rio de Janeiro, desde 1825, indicava aos tuberculosos o Morro Queimado e Cantagalo, por serem mais altos, para que não sofressem a influência do calor do Rio de Janeiro; Torres Homem e Júlio Monteiro aconselharam Teresópolis e Resende, como locais de clima. “Campos do Jordão, antes mesmo de 1800, era conhecido como local de cura da tuberculose, tendo sido mesmo levantada uma casa de saúde para “respirantes”, como lá se denominavam os enfermos, pelos drs. Francisco Romeiro e Gustavo de Godói, antes, portanto, do primeiro sanatório de altitude, que foi em 1890; não conseguimos saber com segurança em que moldes foi assentada essa casa de cura, mas foi verificado que não teve sucesso algum, desaparecendo pelos prejuízos que dava.
A primeira publicação que encontramos sobre clima de altitude e tuberculose entre nós, é de Clemente Ferreira, em 1883, sobre Campos do Jordão, em que estuda os elementos meteorológicos então considerados úteis para a cura, e relata observações de doentes por ele examinados”.
Definiu o prof. Raphael de Paula Souza, fundador dos “Sanatorinhos”, a climatoterapia como o aproveitamento da ação especial benéfica que certos e determinados climas exercem sobre o organismo humano, sendo a aeroterapia o tratamento ao ar livre, ficando o organismo sob a influência dos diferentes elementos atmosféricos e telúricos, nos mais variados climas.
É evidente que a climatoterapia, atualmente, como instrumento de combate da tuberculose, está completamente superada pelo extraordinário avanço quimioterápico da ciência médica.
Entretanto, em fins do século passado, a fama do clima curativo de Campos do Jordão foi decantada como uma das, mais notáveis benesses de Deus.
O dr. João Romeiro escreveu no começo do século a estória de Manoelzinho, um negro escravo de importante fazendeiro de Jacareí. Era o que se chamava até recentemente um “tuberculoso fundo”.
Cada vez mais abatido e doente, o médico resolveu mandá-lo para Campos do Jordão, “que com isso tinha só a lucrar, nada a perder”.
Aceito o conselho, o rapaz começou a subir a serra, do Rabelo, procurando o Retiro do Caiuru, no alto da Mantiqueira.
“Dava pena a sua figura encarquilhada, e chegava a parecer uma desumanidade a remessa àquelas alturas de um doente em seu estado. Mas o médico queria fazer uma experiência, e unicamente para isso lançou mão do pobre preto”.
Pois ao cabo de 30 dias, outro já era Manoelzinho e, no decurso de 12 meses, se declarara completamente são, entregando-se a serviços pesados, tomando sol e chuva, sem a menor reação do organismo. Submetido, ao depois, a acurados exames médicos, foi Manoelzinho considerado completamente curado.
E perguntava o dr. João Romeiro pasmo: “Como, pois, duvidar da eficácia desse clima na cura da tuberculose”?
Pois foi Condelac Chaves de Andrade quem contou que naqueles tempos remotos, em que Campos do Jordão era considerado como asilo de sofrimento, o fazendeiro Inácio Francisco Romeiro, de Pindamonhangaba, costumava comprar escravos por preço insignificante, por serem tuberculosos, e mandava-os para a sua fazenda, situada no Campo dos Moreiras, onde, no fim de pouco tempo, ficavam curados, graças, unicamente, à ação do clima.
O próprio dr.Domingos Jaguaribe escreveu que um fazendeiro comprava por nada os escravos tuberculosos e mandava-os para sua fazenda nos Campos do Jordão. “E ainda hoje se vêem, por cá, alguns velhos, um dos quais se casou, no ano passado, com 84 anos de idade”.
Era a cura natural. Em 1939, o dr. Francisco de Moura Coutinho Filho contou que a fama das qualidades terapêuticas de Campos do Jordão alastrou-se de tal arte que o dr. Jacquerod, um dos mais reputados tisiólogos da Suíça, certa vez, dirigiu esta frase a um brasileiro: “Não compreendo a razão de o senhor vir até aqui, a fim de tratar-se, tendo em seu país um clima igual ou melhor do que o da Suíça, como é o de Campos do Jordão, onde encontrará também recursos iguais aos nossos”.
Aliás, recebi de Sylvio Pereira Moysés, em 1986, cópia de uma carta escrita por Lino Garcez, em 4 de julho de 1929 e oriunda do “Le Grande Hotel Leysin”, na Suíça, e dirigida a um amigo brasileiro. O papel timbrado do hotel de origem anunciava: “Cure d'altitude d'air et de soleil”, e tinha o nome do dr. Jacquerod como médico-chefe.
Mas o escritor Lino Garcez aduzia: “Desde 24 de maio que estou na Suíça. O clima é muito inferior ao do nosso Campos do Jordão. Em compensação, o sanatório é perfeito na sua luxuosa organização. Para que o amigo veja quanto é grande a influência do regime, basta dizer-lhe que estou pesando 70 quilos, coisa que nunca me aconteceu.
O regime é muito severo e o único remédio que dão é óleo de fígado de bacalhau e banana - a nossa banana, que ou nunca pensei fosse tão excelente remédio”...
Nota: Estória extraída da "Revista Brasileira de Tuberculose", n. 31, de maio-junho de 1936, "Os Campos do Jordão", de João Romeiro, "Almanaque Histórico de Campos do Jordão", de Condelac Chaves de Andrade e da Revista "Cruzada Brasileira" nº 35, de agosto de 1936.
Pedro Paulo Filho
15/06/2001
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