A visão verdadeira
Senhor!
Gostaria de poder, um dia, ver a maravilhosa luz e tudo aquilo que magistralmente criaste.
Privado da visão externa, tenho gravadas em minha mente, na minha visão interior, as mais belas imagens produzidas por intermédio das narrativas daqueles que, entusiasmados,apreciam o belo e fazem questão de propagá-los a todos.
Por meio dessas narrativas posso imaginar:o céu azul, o Sol, a Lua e as estrelas;
o mar, com seus tons azuis ou esverdeados, com suas ondas de espumas brancas quebrando nas praias e recifes;
a bela candura e a paz do amanhecer. Raios do Sol surgindo por detrás das montanhas e das árvores de diversas formas e tamanhos;
a beleza do entardecer, com seus crepúsculos maravilhosos e multicoloridos.
Imagino a beleza das águas cristalinas que correm nos regatos tranqüilos e no meio das matas verdejantes, precipitando-se em cachoeiras lindas e murmurantes.
Como é linda e singela a relva molhada pelo orvalho da madrugada ou congelada em geada nas manhãs de inverno.
O sorriso inocente da criança, a beleza e o vigor do adolescente, e a candura da velhice.
Imagino também, Senhor,a beleza e o colorido das flores, das matas e dos pinheirais gigantes,as diversas formas, tamanhos e colorações dos frutos,o colorido e a maravilhosa plumagem dos pássaros e a leveza e a maciez da pele dos animais,a exuberância da mulher com todas as suas formas deslumbrantemente belas e provocantes,a paciência e a serenidade da mãe aguardando o nascimento do filho, fruto do amor mancomunado e idealizado com o sexo oposto,a meiguice da mesma mãe amamentando o filho e ninando-o em seus braços, aquecendo-o e protegendo-o contra tudo e contra todos, dando-lhe a segurança necessária à vida.
Senhor!
Como é bela a natureza que criaste com toda Tua infinita sabedoria.
Não entendo, Senhor,
como, apesar de todas essas belezas visíveis e concretas, muitos tenham a audácia, a coragem e o prazer de participar ou de auxiliar na destruição dessas maravilhas.
Será, Senhor,
que apesar de privado da visão externa eu tenho o privilégio de ver muito mais, muito além do que muitos que têm a graça de possuir a visão?
Será que a minha é a visão verdadeira?
Se isto é verdade, lamento e me penalizo por todos aqueles que não sabem valorizar e reconhecer a Tua generosidade, bondade e poder.
Será, Senhor,
que para essas pessoas poderem dar valor a tudo o que existe de belo na natureza, há necessidade que venham a sofrer a privação da visão exterior?
Coitados!
Têm tudo e não sabem preservar e valorizar o que têm.
São revoltados?
Não entendo!
O que mais querem?
Têm tudo o que é belo à disposição e podem usufruir disto em todos os momentos e oportunidades de suas vidas.
E ainda estão descontentes?
Senhor!
Com Tua bondade infinita tenho certeza de que, mesmo assim, saberás perdoá-los.
Mas eles sabem o que fazem! Não são totalmente ignorantes e agem com convicção.
Por isso, Senhor,
merecem um castigo para que aprendam, embora às duras penas, a lição.
Edmundo Ferreira da Rocha
01/05/1988
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