Marino segura o porco, mesmo arrastado na lama do chiqueiro
Marino Vieira de Novaes e o amigo Aércio Luiz de Oliveira
Marino Vieira de Novaes, natural de Ubatuba - SP (16/03/1930-12/12/1991), uma pessoa que deixou saudades. Veio para Campos do Jordão no final da década de 1940, como muitos, em busca da cura para a tuberculose. Sofreu muito com essa terrível doença. Conseguiu a cura várias vezes. Por outras, acabou recaindo e reavivando o mal que lhe perturbou durante toda a vida.
Depois que aqui chegou nunca mais saiu. Continuou morando aqui até seus últimos dias. Somente saiu em algumas raras oportunidades de férias, visitando o Brasil e alguns outros países.
Juntamente com o Dr. Moacyr Padovan, no início da década de 1950, fundaram o Escritório Comercial de Contabilidade, que permanece até hoje prestando relevantes serviços ao comércio, indústria e particulares de Campos do Jordão, especialmente nas atividades relacionadas ao ramo da contabilidade e afins.
Vitimado por forte agravamento de problemas relacionados às vias respiratórias, infeliz herança da tuberculose, faleceu em 12/12/1991.
Marino, apesar dos sérios problemas envolvendo sua saúde, sempre foi uma pessoa muito otimista, alegre e divertida. Gostava de reuniões com amigos e conversas sobre inúmeros assuntos, especialmente sobre futebol, envolvendo seu time do coração, o Corinthians Paulista.
Conheci o Marino e fui seu amigo por várias décadas, tendo nosso relacionamento iniciado, durante o tempo em que trabalhei no Posto Fiscal, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, por força das relações dos serviços prestados pelo Escritório de Contabilidade, intimamente dependentes, relacionados às atividades da fiscalização desenvolvida pelo Posto Fiscal. Uma coisa que sempre chamou a atenção com relação ao Marino é que nunca me lembro de vê-lo sem o seu tradicional terno, normalmente escuro, camisa branca e gravata, vestido impecavelmente.
Mantinha grande amizade com a maioria dos clientes do Escritório Comercial. Entre esses clientes estava o também saudoso Aércio Luiz de Oliveira (05/09/19319 - 31/08/2009), um dos mais antigos proprietários de açougue de Campos do Jordão. Sua amizade com Aércio era muito antiga, porém foi fortalecida a partir da década de 1960, quando este começou a trabalhar com açougue próprio. Aércio, de família tradicionalmente ligada ao ramo do comércio de carnes e derivados e, também, à criação de suínos e bovinos, era um exímio conhecedor da arte de lidar com as diversas qualidades de carnes.
Marino, como era um grande apreciador de carnes em geral, se encantou com a habilidade do Aércio e tornaram-se grandes amigos, e por inúmeras vezes se reuniam em churrascos realizados em diversos locais e oportunidades, especialmente na casa do Aércio. Foram churrascos memoráveis, com carnes de primeira categoria, devidamente escolhidas e preparadas com a grande habilidade do açougueiro e churrasqueiro Aércio.
A amizade dos dois era tão grande que, em determinada época, resolveram iniciar uma criação de suínos, na antiga propriedade que pertenceu ao pai do Aércio, o Sr. Benedito Vasconcellos de Oliveira, situada nas entranhas do Vale Encantado, aqui, em Campos do Jordão, nas proximidades da antiga e atual sede da Sociedade de Altruísmo e Amor – SAA, especializada nas atividades relacionadas ao ensino em geral.
Nessa sociedade para criação de porcos no sistema denominado “meia”, com as despesas e lucros divididos em partes iguais, permaneceram por algum tempo.
O Aércio contava uma história, também algumas vezes relembrada pelo próprio Marino, sempre de maneira muito divertida, levando a todos que a ouviam a risos intermináveis, especialmente ao relacionarmos a cena inusitada ao fato de o Marino sempre trajar o tradicional terno e gravata.
A tal história, verídica, aconteceu mais ou menos da seguinte maneira:
Em determinada oportunidade, Marino e Aércio resolveram fazer uma visita ao local onde estava sediada a criação de porcos ou, como se diz na linguagem popular, o chiqueiro. Nessa visita aproveitariam para separar um casal de porcos para venda a um interessado que pretendia iniciar criação semelhante.
Como sempre, por mais limpo que seja, chiqueiro de porcos é chiqueiro de porcos. Mesmo que o chiqueiro seja totalmente calçado ou cimentado, sempre vai existir alguma situação que pode ocasionar escorregamentos. Normalmente, especialmente nas pocilgas antigamente utilizadas, boa parte do local fica tomada pela lama formada pela água derrubada na terra pelos porcos ao tomarem água nos bebedouros, pela urina e pelas próprias fezes, mesmo que a limpeza seja diária.
Lá chegando, Marino e Aércio percorreram toda a extensão do chiqueiro. Aércio, como tinha boa prática para identificar os exemplares pelo sexo, já havia decidido quais deveriam ser separados para a venda. Aércio, com toda sua prática no ramo, portando um laço tradicional, daqueles feitos especialmente de couro devidamente escolhido e tratado, trançado por especialista na arte, da forma mais tradicional e necessária, laçou um dos porcos. Imediatamente, segurando o porco no laço, pediu ao Marino: “Marino, por favor, segure este porco enquanto pego outro laço para pegar o segundo porco”. Ensinou ao amigo para enrolar parte do laço no braço e segurar de maneira firme para evitar que o porco viesse a escapar.
Coitado do Marino! Com toda sua inabilidade para o ato, sua visível e frágil compleição física, pegou o laço na tentativa de segurar o porco – que devia pesar em torno de quarenta quilos. Mas foi só o Aércio sair de perto que o porco deu uma arrancada e um forte tranco, levando o Marino direto ao chão, no meio da lama do chiqueiro. Como estava com o laço enrolado em um dos braços, já na lama, sem qualquer possibilidade de levantar-se de imediato, o porco, aproveitando-se do pouco peso do Marino, conseguiu arrastá-lo por boa parte da lama do chiqueiro.
Imaginem a cena. O Marino, com toda sua elegância costumeira, de terno, camisa branca e gravata, segurando um porco, sendo arrastado através da lama de um chiqueiro.
Depois de resolvido o problema, preso o porco que tentou fugir, tirado o Marino da lama, com a roupa totalmente tomada pela sujeira, só restava uma coisa. Sentar, descansar e rir muito e por longo tempo. Um olhava para a cara do outro e não se continham. Riam muito daquela cena inesperada, inusitada.
Boas lembranças de acontecimentos hilariantes, até saudosos que, sem dúvida, fazem parte da história de Campos do Jordão.
Hoje, Marino e Aércio devem estar em outras paragens desse nosso imenso e desconhecido universo, quem sabe, em outras parcerias de criações no sistema de “meia”, desta vez sob a rigorosa supervisão de anjos, arcanjos e querubins, evitando novos tombos.
Edmundo Ferreira da Rocha
10/05/2010
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