Outono em Campos do Jordão
Uma paisagem do outono de Campos do Jordão com os plátanos dourados.
Eu sei que é outono quando as folhas douradas flutuam sobre as calçadas e as avenidas da doce terra jordanense, e ornamentam estes ares com a textura divinizada dos plátanos que pendem do céu de azul incomparável.
Eu sei que é outono quando o sol amaina, quando a manhã preguiçosa avança molemente atravessando o atropelado das horas, e a tarde brilha esplendorosa convidando-nos a percorrer com o coração agradecido os campos verdes que formam nossa Cidade.
Eu sei que é outono quando a noite traz consigo o frio que se insinua sobre as casas, remetendo-nos ao recolhimento, aos livros, às comidas e bebidas, ao amor e ao fogo das lareiras, mas também quando nos incomoda com a lembrança amarga dos casebres, dos barracos, das crianças com frio e com fome, das mulheres abandonadas e alcoolizadas, dos que têm a rua por casa e destino, dos que labutam, dos que atravessarão as noites de inverno em longas jornadas, a pé, acumulando camadas de gelo sobre os rotos casacos e bebendo o café da tarde já frio, embora requentado, mas que levarão adiante sua missão de proporcionar sossego para que os ricos descansem e durmam o sono dos justos e afortunados, ainda que na maioria das vezes sem merecimento.
Eu sei que é outono quando as roupas de lã são retiradas das gavetas dos armários e dos guarda-roupas e são estendidas sobre os gradis, a receber o sol morno da nova estação.
Eu sei que é outono quando a atmosfera anuncia a temporada de inverno, engolidora de sonhos e de homens que se tornam meras máquinas de amealhar a maior quantidade possível de dinheiro.
Eu sei que é outono quando as pessoas silenciosamente se perguntam se geou, e passam a espreitar telhados e gramados com a esperança de ver a primeira geada.
Eu sei que é outono quando o colorido das malhas invade a Cidade em todas as horas do dia, e as crianças desfilam alegremente seus uniformes azuis a caminho da escola.
Eu sei que é outono quando os visitantes param repentinamente seus carros para apanhar as folhas de nossas árvores caídas pelo chão para levá-las para suas casas onde, como fotografias que não mais se revelam (também isto perdemos), farão com que se lembrem desta terra abençoada e guardem em seus corações o desejo de voltar.
Eu sei que é outono quando os cafés fumegam, as praças riem, os cachecóis desfilam e as boinas celebram.
Eu sei que é outono quando o espetáculo do pôr-do-sol no Auditório nos traz a certeza que um fenômeno diário da natureza também pode ser uma obra de arte. E quando o silêncio das alamedas estreitas do Mosteiro das Beneditinas sussurra em nossos ouvidos que o Criador a todos fortalece e protege, e que um dos nomes de Deus também pode ser Esperança.
Eu sei que é outono quando saímos à rua com sacolas improvisadas para recolher pinhões - estes mesmos pinhões que nos trazem a triste imagem de crianças e idosos que passam finais de semana inteiros sentados à beiras das avenidas tentando vendê-los, sob chuva e sol, alimentando-se muitas vezes somente da fuligem dos carros e da piedade daqueles que acabam comprando "para ajudar o coitadinho".
Eu sei que é outono, Cidade querida, quando te tornas ainda mais linda - como se fosse possível, isto- e me vejo refletido em ti, em teus caminhos e montes, em tuas praças e córregos, em tuas árvores e em teus mistérios, nesta tua imensurável vocação de paraíso na Terra, a acolher nos braços teus filhos legítimos e emprestados, e que a todos recebe e abençoa.
Benilson Toniolo
10/04/2014
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