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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

Professor Gustavo, um grande Mestre ! Saudades. 


Professor Gustavo, um grande Mestre ! Saudades.

Professor Gustavo Leopoldo Marissäel de Campos

 

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Professor Gustavo Leopoldo Marissäel de Campos

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Foto montagem feita para ilustrar a crônica: "Professor Gustavo veio me visitar..."

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Gustavão e suas histórias

Na década de cinquenta, mais precisamente em 1957, veio para assumir a cadeira de Matemática do Colégio Estadual e Escola Normal de Campos do Jordão - CEENE o Professor Gustavo Leopoldo Marissäel de Campos, mestre dessa importante matéria integrante dos currículos dos cursos ginasial, normal e científico, da rede oficial do Estado, formado pela Pontifícia Universidade de Campinas - PUC, no ano de 1952.

Vinha de Jundiaí, cidade do Estado de São Paulo, de grande, notória e reconhecida tradição no campo do ensino em geral.

Era, na época, um jovem forte, um professor esbelto e atlético, simpático, de fisionomia marcante e sóbria, de seriedade visível e identificada desde o primeiro instante em que foi apresentado para os alunos do colégio.

Na flor dos seus vinte e poucos anos de idade, trazia em sua enorme bagagem uma inovadora dinâmica de ensino, desconhecida para a época, que surpreendeu todos aqueles alunos ingênuos, de mentalidade altamente interiorana, saídos dos bancos dos grupos escolares ou do curso de admissão ao ginásio, acostumados com princípios educacionais rígidos, impostos pelas famílias da época, normalmente com alguma tradicional descendência estrangeira, porém desprovidos da modernidade que já estava sendo imposta no ensino em cidades mais desenvolvidas.

Seu método de ensino era extremamente prático, rápido, eficiente, eficaz. Desde os primeiros instantes, procurou tratar os alunos com um palavreado mais aberto, franco e adulto, muito diferente daquele ao qual estávamos acostumados em casa ou na escola. Usava termos que, para nós, eram desconhecidos ou até proibidos. A princípio, chegamos a ficar amedrontados e até assustados.

Dentro de muito pouco tempo de convivência passamos a entender sua grande e sábia preocupação de nos fazer crescermos e nos tornarmos jovens e adultos, aptos para enfrentar um dia-a-dia diferente daquele ao qual estávamos acostumados, sempre sob a constante tutela de nossos pais ou responsáveis. Era como dizer: Acordem! A vida mudou. Vocês já não são mais aquelas criancinhas de pouco tempo passado. O mundo os espera de braços abertos. Abram os olhos e corram em busca dos seus destinos, com passos firmes, retos e fortes, caindo e levantando quantas vezes forem necessárias, porém com a altivez e a dignidade daqueles que sabem o que querem e nunca desistem.

O Mestre Gustavão ou Estrelão, como costumávamos chamá-lo secretamente, mudou as nossas vidas e nos fez confiantes de nossas aptidões e de nossos destinos. Aprendemos com ele lições que nunca esquecemos e que nos acompanham durante todas nossas vidas.

Infelizmente, ele ficou conosco somente um ano. Pouco tempo, porém, o suficiente para jamais o esquecermos. Tempos que nos trazem muita saudade.

Durante esse ano em que aqui permaneceu casou-se com a professora Helly Casserta que, também, lecionou por algum tempo em nosso Colégio Estadual.

Voltou para sua Jundiaí onde lecionou, durante um bom tempo, no Instituto de Educação. Aproveitou a oportunidade desse retorno e, ficando mais próximo da cidade onde havia iniciado o curso de Direito, formou-se e instalou-se profissionalmente com seu respeitado escritório de advocacia. Os filhos foram nascendo: primeiramente, veio a Priscila, depois o Fábio, o Afonso Henrique e o Gustavinho. Filhos maravilhosos que, com certeza, herdaram todas as excelentes qualidades de seus pais que conhecemos, respeitamos e admiramos, elos de nossa eterna amizade e admiração por seu querido pai, o Mestre Gustavão.

É incrível, um professor que ficou tão pouco tempo em nossa cidade seja lembrado com tanta admiração e com tanto carinho, durante tanto tempo, até agora, mais de cinquenta anos passados. Se isso ocorre é a grande prova de que sua passagem foi altamente marcante e inesquecível. Também inesquecíveis foram algumas histórias acontecidas naquele distante ano de 1957.

Uma das histórias mais marcantes e dignas de nosso respeito e admiração, da qual jamais iremos nos esquecer, que já contamos inúmeras vezes, em muitas oportunidades, para demonstrar a sua grande qualidade e capacidade de mestre, que deveria ser seguida por todos os professores que, realmente, estão preocupados com o destino e o futuro de seus alunos é a que passaremos a descrever para permanecer registrada por um tempo maior que simplesmente as narrativas verbais.

Nas primeiras aulas de matemática que tivemos com o Mestre Gustavo recebemos uma determinação inovadora e surpreendente. Mandou que todos os alunos, indistintamente, escrevessem na capa de seus cadernos de matemática, em letras garrafais, como dizia, a seguinte frase de autoria do Mestre Catedrático de Português, Napoleão Mendes de Almeida: “ESCREVER E FALAR CORRETAMENTE A LÍNGUA MATERNA NÃO É PRENDA. É DEVER !”

Vejam que coisa maravilhosa, um professor de matemática com a preocupação de que seus alunos aprendessem a escrever e falar corretamente sua língua materna, o português. Na realidade, se formos analisar o que ele almejava com esse procedimento simples, notaremos que sua intenção era que seus alunos dominassem, o melhor possível, a língua portuguesa, pois, com certeza, ele já sabia o que mais iríamos utilizar durante toda nossa vida; que todos os mais diversos momentos e oportunidades de nossas vidas estavam relacionados à facilidade de ler, escrever e falar a nossa língua portuguesa, muito mais que a matemática que, embora altamente importante, na grande maioria das profissões, pode até ser relegada a um outro plano.

Além desse detalhe, preocupado com a nossa língua portuguesa, não ficou somente com essa exigência, que seria muito diminuta diante da grande perspectiva de seus anseios. Em todas as oportunidades, dentro da matéria que lecionava, exigia que o português fosse falado e escrito corretamente. Nas provas de matemática chegava a descontar preciosos pontos por eventuais erros de português. Além disso, cada palavra que encontrava escrita de maneira errada, era motivo para exigir que o aluno a levasse escrita no caderno, cinquenta vezes, para não se esquecer jamais de como deveria ser escrita. Exigia e conferia na aula seguinte, caderno por caderno.

Lembro-me de um colega, o Zé Aparecido, que de tanto escrever palavras erradas e de tanto deixar de levá-las escritas corretamente nas aulas seguintes, foi acumulando débitos que foram se duplicando a cada aula. Chegou a um ponto em que seu débito era tão grande que o professor Gustavo determinou que ele só poderia retornar a assistir às aulas regulares depois das férias do mês de julho, desde que levasse escrito, manualmente, metade do livro de matemática do professor Oswaldo Sangiorgi. Caso contrário, seria encaminhado para a Diretoria com recomendação de suspensão e admoestação escrita na caderneta escolar que deveria voltar assinada pelo pai ou responsável.

Zé Aparecido era o aluno mais velho da classe, primeira série do ginásio – tinha na ocasião dezoito anos. Como não estava muito a fim de continuar estudando, depois das férias de julho, aproveitou a oportunidade e não mais retornou ao Colégio.

O Mestre Gustavão tinha um defeito: era um fumante ativo e assíduo. Nos intervalos entre as aulas aproveitava e tirava o atraso do tempo em que ficava sem fumar. Fumava tudo que tinha direito, infelizmente.

Tinha um costume marcante e característico, até interessante: ao entrar nas salas de aulas após os intervalos ou recreio, sempre com o cigarro na mão, dava uma profunda e última tragada. Enchia o peito de fumaça, chegava bem próximo da mesa do professor que, normalmente, ficava com seu tampo de madeira escura todo coberto com aquele pozinho branco de giz da aula anterior, abaixava-se até que sua boca ficasse bem próxima ao tampo e aos poucos ia soprando e soltando toda a fumaça que estava presa em seus pulmões e tirava todo o pó de giz da mesa. Incrível, a mesa ficava limpinha. Feito isso, já podia começar suas aulas maravilhosas.

Acredito que esse vício de fumar, infelizmente, foi o grande responsável pela doença que veio a vitimá-lo em 2005.

Mestre Gustavo era muito dinâmico e extremamente prático para ensinar a difícil matemática. Mesmo aqueles que, como eu, sempre tiveram certa dificuldade em aprender essa matéria, com suas explicações fáceis e descomplicadas facilmente aprendiam.

Ficava sempre muito atento e comandava a classe todinha. Não permitia nenhum tipo de perturbação durante todas as suas aulas. Era muito sério e objetivo. Algumas vezes, quando começava a perceber alguma movimentação na classe, escrevia no quadro-negro, com a mão esquerda, bem de lado e o mais longe possível do quadro, com o apagador na mão direita. Em dado momento, virava-se bruscamente e jogava o apagador em cima daquele que estava fora de seu lugar, em pé ou virado para o colega de trás.

Nunca nenhum aluno teve a coragem ou a audácia de comunicar aos seus pais ou à direção da escola que o professor havia extrapolado em suas ações. Todos sabíamos que ele estava coberto de razões e nós merecíamos todo o resultado de suas ações.

Em outras oportunidades, quando percebia que algum aluno não estava muito a fim de prestar atenção às aulas, dava broncas inesquecíveis, e ai daquele que ousasse retrucar! Ou levava uns merecidos cascudos, ou era posto para fora da sala de aula.

Todos nós adorávamos o Mestre Gustavão por esse seu jeito rigoroso de agir e de nos tratar. Sabíamos que fora desses episódios que, muitas vezes, até se tornavam engraçados, divertindo-nos, ele era o nosso melhor amigo e estava sempre pronto para nos defender em qualquer situação. Era, durante todo esse tempo em que aqui lecionou, admirado por todos e, mesmo depois de mudar-se para a cidade de Jundiaí, jamais o esquecemos e deixamos de admirá-lo, de adorá-lo como um mestre inesquecível e de altíssima competência.

Sabemos que alguns acontecimentos daquela época, que em nada desmereceu, prejudicou ou criou situação embaraçosa ou inimizade permanente entre professores e alunos, há muito tempo não são permitidos no relacionamento atual em sala de aula. São terminantemente proibidos. Casos menos graves que os acima relatados, hoje, são motivos comuns para a lavratura de boletins de ocorrência policiais, visando ao ingresso de ações penais contra os professores, por desrespeito, abuso de autoridade, maus-tratos, etc., penalizando os mestres e colocando os “coitadinhos” dos estudantes de hoje, “verdadeiros santos” em comparação com os de antigamente, em verdadeiros e privilegiados pedestais de educação, quando, na realidade, sabemos que a situação é muito diferente disso.

Uma coisa é certa: a legislação evoluiu muito, porém deveria dar mais autonomia aos professores. Claro, evitando abusos inadmissíveis e repudiados por qualquer pessoa de bom senso, não permitindo a ocorrência dos absurdos que vêm ocorrendo atualmente na área estudantil entre alunos e professores, desestimulando-os de continuar lecionando, dado os desrespeitos com que vêm sendo tratados pelos alunos.

Os alunos de hoje, muito mais que nós, alunos comportados de antigamente, merecem e necessitam de professores com “P” maiúsculo, rigorosos e exigentes como aqueles que tivemos o privilégio e a oportunidade ímpar de ter como nossos mestres.

Nunca nos ofenderam ou nos maltrataram. Nós reconhecemos que merecemos o tratamento recebido, razão pela qual nunca deixamos de admirá-los e de amá-los, eternamente.

Edmundo Ferreira da Rocha

05/02/2007

 

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